30 de janeiro de 2017

Estereótipo, preconceito e a "obrigação" de ser exclusivamente Yin ou Yang

Photo via VisualHunt



Carlos da Maia, um dos personagens principais da obra Os Maias, escrita por Eça de Queiroz, na segunda metade do século XIX, era um homem sensível, ultrarromântico de um modo que um olhar estereotipado poderia classificar como feminino.

Já sua esposa, Maria Monforte, dona de um espírito aventureiro e libidinoso, poderia ser relacionada ao arquétipo masculino.

O problema dos estereótipos é que eles geram uma dupla confusão:

1. Confundem desejo e identidade
2. Ignoram que a presença dos princípios Yin (feminino) e Yang (masculino) acontecem em diferentes proporções nos indivíduos

Em virtude dos erros mencionados acima, surgem julgamentos que dão a impressão de descrever indivíduos, mas, na verdade, descrevem comparações esdrúxulas e sem fundamento.

A fragilidade da comparação é revelada quando são feitas outras comparações, trocando-se os termos da comparação.

Dessa forma, um homem de um dado perfil pode ser considerado homo ou heterossexual a depender do outro perfil com o qual se esteja fazendo a comparação.

Percebe-se que não há uma conexão necessária entre o desejo sexual e um dado perfil.

A precipitação decorrente do olhar estereotipado também ocorre no sentido contrário, partindo-se do desejo em direção à identidade. É o que acontece quando se espera que uma pessoa cujo desejo é homossexual seja totalmente regida pelo princípio Yin.

Daí decorrem preconceitos como o de pensar que a presença do componente Yang no perfil de um homossexual significa que ele é enrustido ou ainda que um homossexual não pode participar  de atividades Yang porque sua “obrigação” seria ter um perfil vibrando exclusivamente na frequência Yin.

A preguiça de conviver com a complexidade dos perfis humanos e a necessidade de dividir a sociedade em clubes onde, com base no perfil, pode-se ou não entrar, conduz as pessoas a assumirem a postura tirânica de querer determinar a dosagem de Yin e Yang umas nas outras.

E o pior é pinçar determinados aspectos Yin ou Yang, e elegê-los como indicadores exclusivos do “ser homem” ou “ser mulher”.

Consequência disso é a pressão social para que homens e mulheres assumam perfis monossilábicos, sem nuances:

“Homem” deve falar em buceta e/ou coçar o saco
“Gay” deve imitar mulheres, fazendo de seus gestos hipérboles
“Mulhere” deve gostar de artes e estética

Os estereótipos se esforçam por petrificar a relação entre os princípios do Yin e do Yang, caracterizados pela fluidez.

Sabe-se que os clubes ou guetos erigidos em cima do alicerce do estereótipo são pavimentados pelo medo e pelo absurdo de se pensar que o desejo é uma doença socialmente transmissível e a identidade, fora dos muros do gueto, um vírus.

O estereótipo é uma triste metáfora dos anticorpos assim como os guetos são metáforas das células nutridas pelo sangue do preconceito, que dispensa trocas gasosas.

24 de janeiro de 2017

Códigos e ética em salas de cinema pornô de Recife


Foto: Cláudio Eufrausino.


A reportagem, a seguir, é fruto de um ensaio escrito em julho de 2011, para a disciplina Literatura e Filosofia, que cursei durante o Doutorado em Letras na Universidade Federal de Pernambuco. Na época, sequer ouvira falar da obra de Laud Humphreys: Tearoom Trade: impersonal sex in public places.

Mas, mesmo sem conhecer este trabalho, ele é uma referência incontornável, até mesmo para que fique claro que os objetivos do ensaio não são os mesmos perseguidos por Humphreys, apesar de guardar com ele uma semelhança: o de ser fruto de observações in loco.

O autor de Tearoom foi muito criticado pela metodologia adotada em sua pesquisa, pelo fato de obter dados fingindo ser um mero frequentador do espaço que foi objeto de seu estudo. Mas, talvez este tenha sido o preço a ser pago para que o “rigor científico” não levasse os atores analisados a desvirtuar o ritual de conduta por força do peso das convenções sociais.

Contudo, esta deixa inicial é para esclarecer que o propósito desta reportagem/ensaio não é o de estudar o comportamento sexual, mas sim a relação entre o ritual de comunicação e a expressão poética, procurando entender como a arquitetura dos gestos e do espaço se estruturam poeticamente a fim de produzir rituais comunicacionais nas salas de cinema pornográfico de Recife, em Pernambuco. 

As coisas mudaram desde que foi escrita a primeira versão do texto, como foi possível constatar em um retorno aos cinemas em 2013. Um dos cinemas visitados foi interditado pela vigilância sanitária e, em seguida, foi apropriado por uma igreja evangélica. Hoje, não sei dizer o que esse espaço se tornou. Mas, na época em que se levantaram os dados para construção do texto, o cinema pornográfico, situado na Rua da Soledade, rivalizava com a Igreja Católica, distante somente alguns metros.

Outro cinema investigado, o da Rua Corredor do Bispo, mudou radicalmente. O espaço em que havia cabines para encontros íntimos foi destruído e tornou-se “livre”, aberto para encontros entre os frequentadores: a privacidade deu seu último aceno, a despeito da penumbra que continuava povoando o lugar.

Nas culturas antiga e medieval, o sentido não era cênico, mas sim obsceno. Apesar de ser uma palavra de origem obscura, o adjetivo obsceno, como lembra Paulo Bessa da Silva (2010), deriva, provavelmente, de uma modificação do vocábulo latino scena, significando "fora de cena".

O tempo e a cultura se encarregaram de travestir o termo obsceno do sentido de sem pudor, vil, entre outras imprecações. Esta carga pejorativa se deve a uma rede metafórica associando os órgãos sexuais, os bastidores (o fora de cena) e a vergonha.

Sallie Tisdalle, na obra Sussure Coisas Eróticas pra Mim explica: "a raiz latina de pudenda – os nossos genitais – significa 'envergonhar-se'. Ficamos divididos entre o pudor e os abençoados prazeres do corpo, vivendo em meio a uma proliferação de imagens sexuais que nos causam ao mesmo tempo prazer e vergonha".

A maiêutica, metodologia adotada por Sócrates para trazer à luz verdades recônditas, não é decididamente a estratégia mais adequada para procurar os sentidos expressos pelas simbologias presentes no cinema pornô.

Arrisco-me a definir o cine pornô como um espaço feito para estar na penumbra, como atesta a proibição de se tirar fotos lá dentro.


Chegando ao Cinema Pornô

Àquele que entra no cinema pornô cabe o destino dos guerreiros injustos: ser tragado pelo Hades, onde se torna um anônimo. E a forma contemporânea do portão do inferno é guardada pelo preconceito. Estranhamente, porém, a entrada neste Hades gera a sensação de segurança, pois, pior talvez do que o inferno é a ameaça de ser atingido pela primeira pedra.

Ao entrar, compreendi a interpretação dada por Walter Benjamin ao gesto de Adão e Eva. Segundo o pensador, ao comerem o fruto proibido, eles não tiveram acesso ao conhecimento sobre o bem e o mal, mas sim trouxeram pra si a responsabilidade de traçar as fronteiras entre o conhecimento e a dúvida.

Avivou-se no repórter a contradição que segundo Benjamin mora nas atitudes burguesas: em que se avizinham o sentido mesquinho do desleixo e o sentido maior da sabedoria.


No Interior do Cinema Pornô

Foto: KV


A estrutura básica da sala do cinema pornô é a do quadro Quadrado Preto Sobre Fundo Branco de Malevitch. Mas, lá o quadro está invertido: um quadrado branco sobre fundo preto. A escuridão da sala é mais pesada que a dos cinemas tradicionais. E se Giorgio Agamben estiver certo - ao lembrar que a escuridão não é a incapacidade de ver, mas sim o resultado da atividade de células da visão que, sensíveis à penumbra, produzem a sensação de escuro - existe algum componente de ordem imaterial que, no cinema pornô ressalta a capacidade das células ópticas.

Explorar o mapa de sinais em busca de conexões que traduzam a iluminação profana é o convite invisível que pulsa nos rostos, nas paredes, nas cortinas e em todo o resto: o convite da esfinge, com uma pequena adaptação: Decifra-me e te devoro.

A índole surrealista do local aumenta a energia de manutenção do enigma. Nesta perspectiva, nada mais moderno que o interior do cinema pornô. Nele, o modo como Benjamin descreve o surrealismo renasce: "A vida [na perspectiva surrealista] só parecia digna de ser vivida quando se dissolvia a fronteira entre o sono e a vigília, permitindo a passagem em massa de figuras ondulantes, e a linguagem só parecia autêntica quando o som e a imagem, a imagem e o som se interpenetravam, de forma tão feliz que não sobrava a mínima fresta para inserir a pequena moeda a que chamamos 'sentido”.

Feito para estar na penumbra, o cinema pornô faz da sombra um aliado da revolução. Apaga imperfeições e confere substancialidade a qualidades que, fora da penumbra, permaneceriam invisíveis.

As figuras que transitam no cinema pornô nos devolvem o imaginário que lançamos sobre elas, dando a ele uma dimensão quase tátil. 

No cinema pornô, a penumbra torna-se uma tecnologia que permite aos que estão lá se olharem e olharem o mundo ao redor com um olhar contestador do monopólio que a realidade hegemônica exerce sobre a vigília, sobre a “luz do dia”.

É um ambiente capaz de interpenetrar corpo e imaginação. Abriga o eco de vozes emudecidas de justiça, bem como vozes ancestrais de preconceito, fazendo com que certos repúdios sejam intensificados e outros que nem sequer existiriam do lado de fora ganhem intensa concretude.


O Cine Boa Vista – rua Corredor do Bispo

A poética da penumbra, no cinema pornô, é uma das etapas do impulso surrealista de integrar todas as coisas em contraposição à tendência moderna de fragmentação, individualização e isolamento. Esta ânsia reflete-se no Cine Boa Vista, construído com vista irônica e igualmente surrealista para a rua Corredor do Bispo.

Depois de algum tempo lá dentro, é possível desvendar algumas peças de seu código de ética surrealista. Um elemento norteador deste código é a presença marcante de regiões destinadas ao Decifra-me e regiões destinadas ao Devoro-te.

Este código é o que permite compreender por que a maioria das cadeiras da sala de cinema perdem sua função.  Sentado, o vazio contempla a tela que, na sala do térreo, exibe filmes de temática heterossexual e, na do primeiro andar, de temática homossexual.  As poucas pessoas que lá se sentam assumem o papel de enigma, estratégia de sedução voltada para os que ficam de pé nos corredores estreitos junto às fileiras e num pequeno pátio, localizado imediatamente atrás dos conjuntos de poltronas.

Os que ficam de pé neste pátio adotam como postura ética a dúvida. Sabem que estando ali estão dispostos a ser decifrados ou devorados.

A ousadia é permitida, desde que sutil: um toque rápido no órgão genital ou um toque mais demorado com a ponta dos dedos é o rito de passagem entre o decifra-me e o devora-me.  Se o toque é correspondido, a tendência é de o casal partir para regiões destinadas especificamente ao Devoro-te. Se não, cada pessoa segue um rumo diferente. A insistência é repudiada. Nisto, o código de ética é extremamente rígido: forçar o contato é proibido.

A troca de olhares é também outro dos indícios que preparam a transição entre o decifrar e o devorar. Mas, num espaço feito para se imperar a penumbra, o olhar fica em segundo plano. O toque é mais decisivo. Via de regra, as pessoas transitam dentro do cinema pornô sem se olharem, pois olhar, neste lugar, pode ser confundido com um convite para ser devorado. E, operando por indícios, as pessoas, neste ambiente, não querem sair frustradas em sua tarefa de detetives. Além disso, o olhar é evitado por ser um signo de insistência e, em última análise de violação: ambas proibidas.

Na sala destinada aos heterossexuais, a zona do Devora-me é restrita. É uma espécie de gineceu (parte de trás das casas da Grécia Antiga, reservada às mulheres) disfarçado de androceu (ou vice-versa), localizado atrás de um cortinado junto à entrada da sala de cinema. Neste lugar, a poética surrealista atinge o ápice. As individualidades se diluem e na treva total não é possível distinguir onde começa uma pessoa e termina outra. Este área, onde mãos vazam por todos os lados, é a expressão arquitetônica da pintura de El Greco . Estar aí é entregar-se ao instinto voluptuoso de Shiva, deusa hindu da transformação/destruição com múltiplos braços. Sente-se o toque, mas ele é um evento diluído na incerteza de sua origem e de seu fim.

No primeiro andar, “destinado ao público homossexual”, o espaço do Devora-me é mais amplo. É uma espécie de galeria, um pequeno labirinto em que entrada e saída coincidem. Para quem entra, é possível optar pelo caminho da direita ou da esquerda, mas, ao fundo deste ambiente, esta opção revela-se ilusória, pois os dois lados se comunicam, sendo possível dobrar de um lado a outro.

De cada lado desta ilusória divisão, ficam cabines onde cabem duas pessoas e uma cama com pouco menos da metade da extensão de uma cama de solteiro. Na galeria, há luzes esmaecidas e dentro das cabines, a luz de fora ecoa, por baixo da fresta da porta, restaurando a atmosfera de penumbra.

Estas cabines ficam abertas à disposição de quem quiser entrar lá. Diante de algumas delas, alguns homens ficam parados à espera de alguém que os toque ou os chame com o olhar, oferecendo a senha de entrada para o Devora-me. Estes homens misturam no olhar e na postura a esperança de quem aguarda uma rendição messiânica e a desesperança de saberem que muitos “anjos” passarão diante deles sem querer feri-los com o toque, isto é, ignorando-os.


O Cine Mix – Rua da Soledade

Foto: Divulgação Cine Mix


O Cine Mix é outro cinema pornô do Recife, cujo nome já traz a ânsia surrealista por integrar e miscigenar. A ironia surrealista se revela na sua vizinhança, visto estar localizado no início da rua da Soledade, tendo a pouco metros dali, no fim da rua, a Igreja da Soledade.

Ele também possui uma galeria de cabines destinadas ao Devora-me. Mas lá, elas estão incrustadas nas paredes, parecendo as antigas covas que havia nas paredes das igrejas do Brasil colonial e descritas por Gilberto Freire em Casa Grande e Senzala.

Porém, as diferenças são grandes.  As covas descritas por Freire eram destinadas à elite que queria se enterrar dentro da Igreja tanto para se diferenciar dos pobres quanto para se refugiar das chamas infernais que lambiam seus calcanhares.

Já as cabines-lápides do Cine Mix não fazem acepção de pessoa. Quem puder pagar por elas, pode usá-las. E também não fazem questão de manter afastadas as chamas do inferno ou de aproximar o Céu.

Esta indiferença é confirmada no bar, localizado após a galeria de cabines. Neste bar, onde as luzes se acendem, contrariando a natureza de penumbra do cinema pornô, convivem frente a frente dois afrescos: um representando uma cidade imersa em nuvens e outro uma cidade imersa em chamas. Mas, ambos os afrescos parecem ser ignorados por quem está no local.


O Cinema Pornô e o conflito entre igualdade e diferença

No Cine Boa Vista, a igualdade é mais igual que no Cine Mix no que se refere ao acesso aos espaços do Devora-me. Lá, estes espaços saem de graça para os frequentadores, tornando possível romper com os privilégios de classe do ancien regime, de forma que a revolução fracesa nem sonhou em fazer.

Em contrapartida, o Cine Mix é mais igual na paisagem de gênero: lá circulam mulheres, assumidamente prostitutas.

Não há como fugir da igualdade no cinema pornô e não há também como fugir do questionamento que Norberto Bobbio (1995) atribui a Tocqueville e que pode ser parafraseado da seguinte forma: Como é a igualdade quando tira a roupa do ideal e veste-se de realidade?

Quem entra no cinema pornô é igual aos outros porque, seja física ou simbolicamente, a eles se mistura. Todos os que entram lá são em parte heterossexuais e em parte homossexuais, em parte prostituta e em parte clientes, em parte santos e em parte depravados.  Foi possível descobrir isso, quando vi uma figura semelhante ao Quasimodo circulando pelo cinema e vi que não tinha força nem autoridade para fazer-me diferente dele.  De algum modo eu era parte dele e ele parte de mim. A distância é permitida no cinema pornô, mas não os muros.

A penumbra do cinema pornô esforça-se – muitas vezes com sucesso - por desfazer oposições que, do lado de fora, são tomadas como irreconciliáveis, a exemplo da beleza e da feiúra.

A individualidade - nesse contexto que mistura relaxamento e urgência; sedução e indiferença - parece, em alguns momentos, perder a função. E o indivíduo converte-se em montagem de referências históricas (estereotipadas ou não) que conseguem escapar por entre as brechas da penumbra.

Diante desta reflexão, é preciso reformular o que se entende por decadência.  A decadência é emprestada por um olhar que, da luz, mira a penumbra. Não mora no ambiente ou nos freqüentadores, em si, mas na ameaça que a penumbra instaura sobre a auto-suficiência de nossa individualidade.  Achar algo decadente é expressar o medo de que nossa suposta auto-suficiência seja, de algum modo, violentada pela miscigenação.

Estar no cinema pornô é refletir sobre o preço da igualdade, o que não deixa de ser refletir sobre o preço da diferença. 

16 de janeiro de 2017

A viagem, o retorno e a árvore do segredo


Photo credit: Landahlauts via Visual hunt / CC BY-NC-SA



A felicidade me sente
O sentimento me felicita
Cada vez que posso fazer parte da tua trajetória
E escrever é uma maneira de ter mais tempo de ficar te olhando

O cinema, a praia, o motel
Todos queriam que houvesse mais tempo para nós dois
Tempo para que a árvore do segredo dê seus frutos de amor
Espero que o bioma campinense não renegue a árvore que
Nossa história vem esculpindo
Digo nossa porque você é o melhor nós que a vida me deu
Um nós sem amarras

Te desejo toda a felicidade do mundo nessa nova aurora
Que você conheça pessoas, lugares e comidas fantásticos
Mas que a felicidade não silencie o Voltei Recife no teu coração

Tenho medo porque você é tão incrível
Que todos vão te amar muito no teu novo horizonte
E você pode não querer voltar

Me ajuda a ter um pouquinho mais de coragem de dizer que Te amo
Com todas as letras
Porque os silêncios dizem isso tanto
Que já ficaram com calos nas cordas vocais
E as matemáticas desistiram de tentar
Me convencer que a raiz do que sinto é irracional 

Vamos marcar uma desculpa pra passar a noite abraçados
Até que a opinião pública pipoque

Não posso mais brigar contigo (só uma vez ou outra perdida)
Porque Eu te amo
Fazer a paz contigo é muito excitante

Que vontade de participar do teu recomeço

Não vou conseguir ser mais o mesmo ukê 

Posso ir te visitar nas minhas férias de maio?








Olha aí embaixo uma foto da árvore do nosso segredo de amor:

Photo credit: Landahlauts via Visual hunt / CC BY-NC-SA



15 de janeiro de 2017

A importância de escovar os dentes para quem sonha

Photo via IvicaM via Visualhunt


Desejo que você sempre tenha disposição para escovar os dentes antes de dormir
Com vigor, determinação, investigando com a escova cada esconderijo bucal

Que a escova seja em tuas mãos como a lupa costuma ser nas de Sherlock Holmes

O gesto de escovar os dentes reflete a forma como se encara a própria vida
Na verdade, escovar bem os dentes antes de deitar é a senha para abrir a porta do sonho

Que tua alma sempre ache razão para sorrir no teu desembarcar onírico
Como a minha depois da festa em que fui abençoado com tua presença

Se bem que, ao teu lado, o sonho começa antes do adormecer
E a festa acontece sem precisar do aval do antes ou do depois

Ganhei presentes d'outros,
Mas quando tua timidez sorri ganho o presente, o passado e o futuro
Você é o desengonçado mais lindo da festa do mundo
Nenhum Kassab pode limitar nossa conexão

Meu eu complicado quer descansar no teu peito
E meu sonho aikidoca quer ser como um rio que corre do mar para o teu abraço

Há quem pense que minha poesia é fruto da espera por quem não existe
Ou de um vazio que se contentaria com qualquer um que me levasse pra cama
Só tenho uma coisa a dizer: quem muito pensa pouco sonha

Cada parágrafo da minha poesia te faz um tipo de carinho

Este verso nada em teus cabelos
As sílabas do próximo rimam com as linhas de tuas mãos
Todos solam Eu te amo ao pé do teu ouvido
Curando os calcanhares de Aquiles que se escondem em tua caminhada

Existe um verso que percorre transversalmente o despertar dos meus sonetos
No ritmo do meu coração que pára, fica mudo, emburrece
Verso sem cor, palavra ou paradeiro
É o verso do meu beijo
Ansioso por descobrir o sabor da tua pasta de dente

Por beber do teu solrriso

7 de janeiro de 2017

Manifesto do Orgulho Macho


Foto: Karla Vidal


Tenho 36 anos, mas vou esperar até os 35 para casar
E, quando eu tiver completado 30, vou ser o homem que todos esperam que eu aparente ser
Todos os que cabem no meu medo

Vou deixar de sentar ao lado de quem amo
E pedir que ele saia das fotos em que estou
Porque sou macho por excesso e homem por falta

Vou expor quem amo ao ridículo e correr o risco de perdê-lo
Vou deixar de ser o cavalheiro gentil e lindo, que costumo ser,
Pra dar satisfação à bula das aparências

Vou ali torcer pra que quem amo seja desclassificado pelos amigos dele
Pra ter a oportunidade de me juntar ao coro e desclassificá-lo
E colocá-lo no seu devido lugar: fora da foto,
Fora do alcance da minha companhia
Porque sou macho por excesso e mulher por falta


Lembrai-vos: o macho pode ter rola ou buceta, pode ser hetero ou homossexual
O que faz o macho são as suas circunstâncias

Meu amor, não sei quem esteve a meu lado no jantar de ontem
Mas, quero pedir a ele que te traga de volta pra mim
Traga-se de volta pra mim
Porque teu maior encanto é ser mais homem que qualquer macho
E os amigos vão te amar pelo que você é

E se você me amar, os amigos vão te amar também porque você me ama
Porque sou amado pelos amigos pelo que sou
Os amigos não precisam ser todo mundo, essa ilusão quimérica
A América do Sul é o bastante
Tenho amigos que me amam e amam quem eu amo

Ah, se eu fosse pra cama com todos que acham que eu quero ir pra cama com eles...
Mas, a ironia é que eu só quero ir pra cama com você
Aliás, com você eu iria até para o estado de coma
Se você quiser, pro que der e vier, porque estupro não é minha praia

Não se preocupe, minha companhia vai ficar longe do seu registro histórico

E, se a ditadura se consolidar,
Tomara que você não engrosse as fileiras dos machos
Que, ao se apresentarem a alguém,
Em vez de “Como vai Você?” dizem “Prazer, eu como buceta” ou "Satisfação, meu negócio é rola"

Não preciso mentir quando te acho lindo
Porque você de fato é, só precisa tomar posse desse fato
E não vai ser minha ausência da foto que te dará essa capacidade
  
Não preciso ser uma mulherzinha ou um mulherão pra ser mulher
Ou uma cachorrona ou uma menininha ou um avião
Sou uma mulher que dispensa essas metáforas viciadas,
Com o pulmão intoxicado

Não preciso ser um cafuçu ou um malandrão para ser homem

Não preciso ser um florzinha, ou um urso, ou um purpurinado ou um sapato extra grande
Para ser gay

Sou homem e/ou mulher porque sou uma imagem e uma dessemelhança
Que não cabe
Em nenhum clichê, foto ou película
Os bastidores do coração de um homem e/ou mulher são 70 vezes 7
Mundos inteiros

Nem o arco-íris consegue dar conta de representar
O dilúvio de cores que compõe o espectro do ser humano

Se a ditadura se instalar, não esqueça que todos os seres humanos pertencem
A um único partido: o da integridade
E, assim, merecem ser tratados
Este é o verdadeiro partido do Sol.

Obs.: A opinião alheia é péssima em fazer chegar carinho às zonas erógenas
E não ecoa no coração que escolhe abrir as portas para a felicidade

2 de janeiro de 2017

As ações do terrorista brasileiro e os nós inflamados do tempo

Fonte da Imagem: Tyn Magazine


O que se chama de sociedade em rede se caracteriza pela interconexão de informações, pessoas e, sobretudo, de memórias.

As redes têm nós e estes nós podem ser pontos de suavização  ou de inflamação da interconexão.

A rede temporal ressignifica  a ordem clássica do tempo, entendido por Kant e Newton como a sucessão irreversível de passado, presente e futuro.

O tempo em rede tende a ser intemporal, como observa o sociólogo Manoel Castells. Diferentemente da linha do tempo, o tempo estruturado em rede forma nós a partir da interconexão entre diferentes trechos do livro histórico da memória.

É o que se observa nas atitudes de grupos neofascistas, onde um nó hiperbólico e inflamado cria um canal de contato com a memória histórica dos regimes totalitários italiano e alemão, cujo ápice aconteceu na Segunda Guerra.

O que diferencia a estrutura em rede do momento atual é a velocidade com que memórias se convertem em discurso e deságuam em atitudes, unindo reflexões de alta complexidade em torno da irreflexão fanática.

O italiano Antônio Gramisci , duramente perseguido por seu posicionamento político, observa que existe um gap, um desnível entre a infraestrutura (mundo da produção material) e a superestrutura (mundo das ideias e valores), não havendo correspondência imediata entre uma e outra.

Contudo, o que se percebe, na sociedade em rede, é que esse desnível está diminuindo, mas não em virtude das conquistas tecnológicas que viabilizariam o estreitamento da distância entre criatividade e realização.

Estão sendo esculpidas hediondas quimeras, mix de preconceitos ancestrais, mitificações e ciência/filosofia fast-food. Jovens, com horizontes estreitados pela ideologia do imediatismo e lucro às avessas (lucro que se contenta com o prejuízo alheio), buscam na violência canal para converter automaticamente superestruturas bizarras em infraestrutura de violação do ser humano.

Evidentemente, essa tentativa artificial de conversão automática da superestrutura em infraestrutura tende a atitudes voltadas para a aniquilação do diferente.

O ódio gerado desse impulso talvez não seja contra as minorias, mas contra a inflamação que os nós dos estilos de vida alternativos representam para os que se julgam donos da linha do tempo e gestores da memória. Os fanáticos, tirânicos e intolerantes enxergam nesta inflamação não a flama que mobiliza o ser humano rumo à criticidade e à emancipação, mas sim uma doença. 

Em carta, o brasileiro responsável pelo atentado covarde em Campinas, matando a ex-esposa e outras 11 pessoas, culpou a emancipação feminina por seu gesto, em uma espécie de louvor ao suposto paraíso perdido da supremacia do macho.

Talvez, esta ilusão machista seja somente uma das vertentes de um nó inflamado na estrutura de tempo da sociedade em rede. Inflamação do orgulho ferido de uma geração narcisista, que esperava ser superior econômica, moral e culturalmente a de seus pais, mas não foi. E onde há esse tipo de orgulho ferido é solo fértil para ideias fascistas que buscam “degenerados” para servir de bode expiatório, sacrificados no altar da frustração. Os orgulhosos feridos se contentam, então, em endeusar um suposto passado ideal, mantendo aberta a ferida ao invés de passar elixir sanativo.

Karl Marx chegou a afirmar que a razão humana só liberaria seu potencial, isto é, a criatividade, ao fim da exploração de um ser humano por outro. Nossa razão tecnicista e complexificada, disfarçada de criatividade, tem tido profunda dificuldade de enxergar isso.

1 de janeiro de 2017

Feliz Ano Novo fatorial ou quando Deus costurou as rachaduras de um vaso Ming


Fonte da Imagem: Arte a Scuola



1980, que,  em 2017, você não necessite lutar para que nenhum 1986 se apaixone por você

2017 está chegando. Será bom ele não esquecer que, em sua corrente sanguínea,

Correm os idos de 2016, 2015, 1945, 1888, 1789 e assim retrospectivamente


1986, não tema 1980, porque seu segredo está guardado comigo
Pode convidar 1980 para dançar até os pés virarem asas
Até a luz desacelerar

1986, sua nudez é mais bela e valiosa do que Ralph Lauren jamais suporia
2017 é ano influenciado pelo planeta Saturno, como lembra a amiga Roberta Soares
Ano que deixará marcas profundas, muito mais importantes que as marcas estampadas
No peito esquerdo de camisas de grife

Uma chuva de 1964 está tentando molhar a varanda de 2017
E, com sombras que falam metade russo, metade alemão e metade brasileiro, importadas de 1988, 1987...1946, tenta erguer muros sobre os bons auspícios de Woodstock

2017, nasces contabilizando vítimas e o cinismo incontabilizável prepara-se para rir de ti

2017, será que a distância fará quem amo não me querer nem pra dizer que vai embora?

1986, você já era lindo em 2000..., 2011, 2012...2017
Lindo com essa mistura nerd de Alvin, Luke Skywalker e um samurai desajeirado
Antes e depois da ortodontia, teu sorriso transforma a linha do tempo em espiral
Me envolvendo

Que 2017 abrande a saudade que 1980 sentirá de 1986.


Todo ano é Ano Novo e Ano Velho,

Por isso, Stanislaw Ponte Preta desejava Feliz Ano Bom

Até breve

E, que minha fé esteja acesa na chama do Até sempre!


2016, velho adolescente que não pretendo expulsar da festa da existência,

Vamos conversar e tentar resolver as complicações do pós-operatório


2018, que 1986 consiga remoção para Recife e não se esqueça de 1980 até a hora de voltar pra ele ;)


A única coisa que desejo ver explodir em 2017 é a opinião sobre a vida alheia
Se houver espaço para milagres, nesse ano saturnino,
Peço que Deus costure impecavelmente as rachaduras dos vasos Ming cujo coração estampar amizades-amor






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