24 de junho de 2016

Enigma do odor: o sentido do olfato


Foto: Karla Vidal


Fatídico

O olfato cavalga solitário no Velho Leste, é fato
É um tato que, de tão sutil, evanesceu-se
E, sem auxílio de cão, guia ou luz de candeeiro,
Procura o motivo
Procura-se: vivo ou horto

Despediu-se das mãos do jardineiro
Depois que na Roma de todas as flores
Mudaram de endereço todos os aromas

No ardor do parto,
Encoberto de frio,
Meu rio aguado se pergunta seriamente
Onde é a nascente da chave da porta que
 Se Abrirá, surpreendendo meu toque
Com a visita da reciprocidade
Porque a porta fechada da ilusão
Tem sido um presente que não se dá trégua
Mágoa muda, renovando-se
Rinchando na minha mão do ouvido

O cheiro me lembra de que escrever
É só um jeito de ser feito de bobo por todos os amores
Que nunca me amaram
De ser feito de amor por todos os bobos que perderam a chance de me amar

Perguntaram-me se ando lendo algum tempo atrás
E só agora sou capaz de responder
(antes nunca do que tarde)
Estou compenetrado na tarefa de traduzir o cheiro
Que me acena das entrelinhas do meu amor distante
Mas esse cheiro forte como só a suavidade consegue ser
Desmente o texto original escrito por minhas visões
Que não conseguem ajudar o abraço perdido nos pontos cegos do meu destino
A achar o aconchego

Um cheiro de dente-de-leão me mordeu, agorinha
E todos os meus olores se perceberam nus
O olfato continua firme no seu intento de revelar
Que os feitiços são, na melhor das hipóteses, inúteis
E, na pior, uma tremenda perda de tempos em tempos
Porque, em breve, penso eu
O cativeiro da solidão será encontrado
E, não será vã a lida de vencer o sequestro do sol
Em diferentes idiomas (dizem as boas línguas)
Posto que, como sabe quem foi feito um para o outro
O beijo é a prova cabal de que há uma eterna aliança
Entre o olfato e o paladar

Como não sou capaz de escrever o cheiro,
Deixo na caixa postal do meu futuro namorado recíproco
O sinal que mais se aproxima do aliviante odor:

...

12 de junho de 2016

Ensaio de uma confissão amorosa e a dialética da vergonha alheia

Fonte da imagem: Blog DeCristorevestidos


Assim como no carnaval, o Dia dos Namorados é um momento em que as pessoas se permitem fazer certas coisas não recomendáveis no cotidiano. É um dia que inspira a confissão de amores secretos ou que ainda não se perceberam amores, mas estão na beirinha de perceber, esperando só um empurrãozinho pra cair voando no abismo.

A confissão, linguisticamente falando, admite duas modalidades: a direta e a indireta. Esta última, da qual trataremos nesse texto, trabalha em cima de dois elementos sintáticos: o sujeito desinencial (antigo sujeito oculto) e o objeto direto e indireto (ao mesmo tempo).

Outra característica da modalidade indireta da confissão é tentar curar a timidez do gesto com outro que causa vergonha alheia. E, filosoficamente, a vergonha alheia é definida como a tensão dialética produzida na encruzilhada entre doçura, ridículo e libertação.

O sujeito que confessa busca um gesto que o revele sem o entregar por completo assim como a desinência do verbo expõe o pronome pessoal sem que ele precise aparecer na frase. No caso do verbo “Amas”, por exemplo, a desinência “s” indica se tratar da segunda pessoa, isto é, Tu: Tu me amas ;)

Por sua vez, o objeto da confissão indireta é um objeto ao mesmo tempo direto e indireto. Mais direto que o próprio objeto direto, pois o esforço para disfarçar que uma pessoa é alvo de nossa confissão imprime uma carga de verdade que aumenta consideravelmente as chances de o alvo ser atingido em cheio.

A tentativa de fazer a flecha chegar ao alvo direta e indiretamente, ao mesmo tempo, aumenta drasticamente as chances de ocorrência do fenômeno da vergonha alheia, mas as doses de doçura e libertação liberadas na corrente sanguínea do tempo-espaço são bastante compensatórias.

Eis alguns exemplos de confissões indiretas obtidos por meio de delações premiadas:

“Lembro de você ter dito querer assistir Tartarugas Ninjas. Também tô com vontade de assistir, de mãos dadas contigo”

“Ficou bem essa camisa, mas prefiro você vestido de nudez”

“O luar tá tão você esta noite... Quer dizer, tá tão lindo”

“- Você tá bonito que só ontem” (nesse caso, se houver a réplica do sujeito, é só correr pro abraço):
“ - E hoje?
Hoje, você não tá só bonito. Tá bonito comigo.”

“Sopra esse cisco aqui no meu cangote, por favor”

“Que tal convidar a luz de velas pra jantar com a gente?”

“Você acha que meu namorado ficará com ciúmes quando descobrir que é você?”

“Você pode ir uma ou duas vezes por semana lá em casa me ensinar a plantar Boas-noites?”

“O que faço pra meu sonho deixar de pensar em você?”

“Tem um filme ótimo pra gente deixar de assistir juntos”


“Tua companhia, mesmo à distância, me deixa muito feliz”

"Te vendo assim, deu vontade de chamar teus defeitos pra sair comigo"

11 de junho de 2016

O Dia D, namorados (as) e o direito ao contraditório pessoalmente


Fonte da imagem: Jornal GGN


O dia dos namorados provavelmente será depositado com retroativo em minha conta,
Que esquece o significado de dinheiro, juros ou promessas quando você sorri

esti minha melhor barba na esperança de te encontrar, por acaso,
nteontem
Só ão consegui vestir minha melhor coragem de dizer que quero treinar contigo
s abraços que ensaio em meus sonhos, onde estou vestindo minha nudez mais acolhedora
Para te ajudar a ser tua em-vergonhice mais doce
Porque o abraço, assim como o Aikido, só xiste quando duas ou mais pessoas,
Dia D ecidem ao mesmo tempo sair de si esmas

Mas, por mais indispensável que eja a veste da poesia
Ela é só uma olidão que me az companhia
Incapaz de substituir o essoalmente
Aquele não saber o que izer que diz tudo
Na língua intraduzível do toque
Que me ntroduzirá teu beijo: o agrado direito sem voz ao contraditório


6 de junho de 2016

Prece pelo Brasil golpeado e ferido



Senhor, permita-me falar contigo em voz alta
Para sentir que estou falando com uma pessoa e não com uma metáfora
Ajuda todos os que estão tendo suas bolsas e asas de pós-graduação cortadas
As crianças e jovens que terão seus sonhos cortados
Para que custe menos aos miseráveis de colarinho branco
Manter-se invulneráveis e blindados

Que não entre em vigor a noção de que estar bem
É não estar mal sozinho
E que ver os sonhos alheios ruírem
Não seja a medida do progresso
Nem a jurisprudência que faz das leis sopa de letras
Seja o arcabouço da ordem

São José operário possa se juntar a mim nesta prece
Ele que viveu o desterro, que viu o filho nascer na estribaria
Porque não achou lugar
Que o Cristo nascido como metáfora da lavagem
Ajude-nos a achar lugar  e meta nesse mundo perdido dentro-fora da galáxia Brasil
E que o lugar no mundo não seja reduzido ao desejo de fugir
Para o paraíso europeu
Que sejamos capazes de construir novos lugares
Sem precisarmos de visto para o degredo

Que o luxo diminua e o conforto cresça
Rasga o terno e gravata que insiste em descosturar a nudez dos sonhos
E esvazia as piscinas que, às custas do cansaço impingido à sede de justiça,
Encheram-se de água mineral para virar criadouro de dengo
De miseráveis togados, que nunca experimentarão o sabor da água viva.

Abre os olhos de nós pobres que, para pensarmos que somos ricos,
Corremos o risco de acreditar que o mundo está naturalmente dividido
Entre quem é rico em 12 vezes
E quem parcela a fome em 30 vezes mensalmente.

Ajuda-nos, a não vendermos o nosso Bom Dia
E não nos contentarmos com o trocado de uma conta milionária no exterior
Regada à falta de leitos em hospitais que teimam em fingir que existem

Que um grande amor possa me encontrar numa das esquinas dessa crise farsante

Porque a crise, em boa companhia, tem aroma secreto de desafio

2 de junho de 2016

O Monte Fuji e a teoria da recepção de textos

Fonte da imagem: Blog Ásia Comentada


Impossível saber ao certo se o texto nunca será lido ou se sempre o será
O único leitor garantido de um poeta é o Talvez

Quando se escreve, o poema é destinado a uma única pessoa
Que talvez nunca o lerá
E, acidentalmente, pode se tornar propriedade privada de todas as gerações
Pelos ecos dos séculos e confins: Amemos!

A ti, arco e alvo destes versos brancos
Preciso te dizer, na fratura exposta deste segredo, que
Minha única pressa é ser um dos elétrons que compõem o orbital da tua alegria diária,
Quero fazer uma ligação covalente pra ti
E, de repente, despentear teu cabelo até as preocupações e temores entenderem que
Teu coração é maior

Aos outros que me honram apropriando-se indebitamente desse texto
Digo: Não se preocupem. Não os culpo
Pois assim que começaram esta leitura cheia de finalidade sem fim, vocês se declararam presos em liberdade incondicional

Este poema não foi escrito para todos, somente para você
E pra ti
O trânsito para com teu charme e flui com tua integridade e despretensão
Minhas rimas recebem muitas flores de lótus
Quando tua timidez orvalha carinho sobre minhas noites
Sem esforço, calaste o Fuji e, por tabela, o meu fugir

Fique tranquilo, Japonês é mesmo uma língua difícil

Mas, o beijo, tradutor universal, é capaz de vencer barreiras linguísticas aos montes
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