28 de março de 2016

A garça e a correspondência descalada de um ressuscitado

Garça e por do sol 02
Foto de: LandNick


Graça
Por Linav Koriander

Pensei na melhor maneira de te consolar
De fazer o que eu digo chegar a teus ouvidos de um jeito
Que faça voar a sarça do teu ardor gracioso

A certeza da morte, contudo, parece tão sem sombra de dúvida
E, mesmo assim desártico, posso estar aqui contigo, nessas palavras, dispindo-me do meu corpo
E estar contigo no além-mar, despindo-me do meu porto
E ressuscitar contigo, pouco a pouco, dispondo-me de tais hortos

O ressuscitar é o meu “Eu te desafio” 
E pode estar certo que vou continuar te desafiando
A seres tua habitual inteligência secreta, persistência misteriosa, elegância discreta
A me trazeres satisfação com o melhor seguir em frente que puderes revestir

Daqui, de onde ressuscito aos poucos, ponho em ti o alvo de minha admiração mais certeira
E nenhuma alternativa conseguirá desmentir qualquer estrela da constelação dos teus passos

Tenha paciência, porque a ressurreição demora um porto
Mas devo te dizer que, daqui, de onde a demora reza,
Cada vez que a nota aguda da alegria aira teu ser
O nosso reencontro vai encorpando o gosto do “parece que foi ontem”

Os bons-dias, tantas vezes, saturados do mesmo sol minguante
Encontravam, num comentário besta qualquer, uma brecha para sair
E te fazer rir até encontrares aquela parte de ti que tem motivo para continuar sonhando

Na verdade, nunca foi preciso razão alguma porque nenhuma riqueza, reino ou língua estrangeira
Seriam capazes de me fazer decidir não ressuscitar

Ressuscito cada vez que decido
E não me canso de decidir quando o assunto é te ver feliz

Ditador confesso,
Decido desdizer tuas dores
Com a melhor doçura que já pousou nestes lábios
Te ler feliz, com a força das armas que só as entrelinhas da Costa Rica são capazes de exportar

Faz as pazes comigo e acelera a reação química que me está ressuscitando

Meu silêncio não vai desistir de tramar a coincidência de nossas ressurreições
Não necessariamente agora,
E, por enquanto, seja teu estar vivo o melhor presente que meu passado e futuro podiam querer

Encontrei um cartaz  e nele estava escrito “Procura-se Vivo e Lindo” 
Estava numa encruzilhada onde se encontravam a rua da alegria, a do sol, a da aurora e a da saudade
E todas elas me prometeram que
A distância não é capaz de me impedir de pagar o apreço
Do teu resgate
Até porque teu brilho humano e controverso é capaz

De me fazer ressurgir antes e depois da procura

25 de março de 2016

Uma nova chance para Pilatos




Ouvindo a narração da Via Crucis, transmitida, ao vivo, da Catedral de Aparecida, notei como o texto procurava mostrar que não havia sido escrito com caneta e papel, mas sim com lupa e carne. Os detalhes das torturas ressaltados telescopicamente: a carne lacerada, os nervos e ossos atravessados não só pelos pregos, mas pela omissão e pela canalhice do mundo.

Um quê de sadismo? Certamente talvez. Contudo, faz parte da arte vivenciar a ferida alheia elevada à septingentésima potência sem que nossa pele sofra nenhum arranhão.

No martírio de Cristo, o riso e a dor travam uma batalha decisiva. Comédia e tragédia ficam em dúvida sobre o que são diante de ações dramáticas nas quais o riso ri da dor, transformando-se em escárnio, e a dor, espelhada na fácies hipocrática do riso doente, torna-se horror.

O narrador da Via Crucis que eu entreouvia, deitado na cama, falou algo que me prendeu a atenção: “Cristo cai pela terceira vez com a cruz. Todos os que o cercam são, nesse momento, Pilatos, omissos, e optam pelo gesto fácil de lavar as mãos”.

E perguntei-me: Como não ser Pilatos? Pilatos tinha outra escolha a não ser ser ele mesmo? Ele tinha poder, mas não tinha porque o poder lhe era o poder delegado do alto

Ele deve ter pensado com os botões de sua túnica: “Este Cristo é admirável. Em outro momento, seríamos amigos e jantaríamos juntos. Mas, no atual contexto, o que posso fazer é deixar que ele seja um pouco martirizado e, assim tentar aplacar a sede de sangue do povo.”

Mas, a sede de sangue não foi aplacada porque não era sede, mas conveniência. Convinha a morte de Cristo aos interesses dos poderosos e também ao interesse da população de ver no chão uma pessoa que ela mesma tinha alçado à posição de deus-esperança

Lavar as mãos é a fórmula da tragédia, que habita o local onde decidir é impossível

Se a pessoa tem o poder sem tê-lo
Se ama sem amar
Se quer sem querer
Se se sacrifica sem se sacrificar
Nestes “ses”, resta a opção de lavar as mãos

Pilatos é o ápice da tragédia, na narrativa de Cristo. A figura de Jesus, mesmo tendo sido totalmente desfigurada, não é, ao fim, uma figura trágica, porque ele exerceu o tempo inteiro o poder de decisão, tomando decisões que, até hoje, desconcertam, por oscilarem na fronteira discursiva entre a lucidez e o absurdo, a exemplo de “amar o inimigo” e “perdoar quem te mata”

Pilatos não tinha como decidir. Percebendo a tragédia de sua condição, o próprio Cristo chamou atenção para o fato de que o mal maior não estava sendo cometido pelo representante romano, mas sim por quem o tinha acionado

Ser como Cristo ou como Pilatos?  Talvez a pergunta de nossa época, durante os próximos dias, pelo menos, não seja esta, mas sim: Como decidir?

Acho que existem muitas pessoas de boa-vontade que têm buscado e, em certa medida, encontrado, lugares intermediários entre o sacrifício total de Cristo e a omissão de Pilatos. Mas, nossa herança trágico-cômica, ainda tende a encarar como verdade os extremos. Neste sentido, sacrificar seria abrir mão de si mesmo, anular-se, restando a quem não está disposto a isto omitir-se

Certamente talvez, sejam possíveis sacrifícios que não anulem a nós mesmos e que ajudem o outro a não cair numa zona de auto-anulação. E também é possível privilegiarmos a nós mesmos sem lançar o outro na zona de anulação


E nada do que eu disse anula o valor das decisões de Cristo, que, até hoje, abalam os tronos e os altares dentro e fora de nós, ajudando-nos a redimir os sacrifícios extremos e as omissões extremas na história e na alma

23 de março de 2016

Le jeûne et la prière par les inutiles (Jejum e súplica pelos inúteis)

Arte de Sylvain Grand'Maison


Tentei me abster da fome, mas não pude
E, logo na primeira linha, percebo que o jejum é inútil
Mas, ai do mundo sem os inúteis, que, na maior parte das vezes,
São Indispensáveis
Pensemos, agora, em tudo que nos é inútil
Ou em todos que nos são inúteis

Temos por hábito inutilizar as pessoas
Porque se elas fossem o tempo todo úteis (muito úteis)
Seria insuportável o peso do cálice em nossas almas

Contudo, existe a tendência de exagerarmos na dose
E inutilizarmos os outros até torná-los de fato inúteis
E aí esquecemos que nos momentos cruciais, e também nos ressurrecionais,
É sempre um inútil que está por perto sendo indispensável
São os inúteis que nos salvam, sem ser messias
Que nos acendem a potência, sem ser super-homens
Que nos recriam, sem ser deuses
E nos amam ardentemente como só os aquém-do-homem são capazes de fazer

Eis a razão do jejum: devolver a dignidade aos inúteis
Porque normalmente os que nos são úteis são apenas cúmplices da alegria,
Do vinho, da pança cheia e da soberba

Os inúteis se permitem estar invisíveis e nos fazem companhia
Na alegria que nutre o coração em vez de superavitar o balanço contábil da vaidade
Na dor que, à luz do abraço inútil e invisível, lembra-se de que existe e se esquece de não passar

Ingrato o trabalho dos inúteis que nos oferecem remédio e são vistos como quem nos deseja ver doentes
Que esperam acordados até o final dos tempos e são vistos como articuladores do Dia do Juízo
Que não são vistos e são vistos como indignos de serem vistos

Os inúteis são capazes de nos amar verdadeiramente
E se abstêm do seu próprio existir para estar a nosso lado
Incógnitos nas maçantes mesmidades do cotidiano
Perceba que, muitas vezes, certamente talvez, nós cagamos e os inúteis é que dão descarga

Muitos inúteis pegam o trem e não retornam
Porque alguns úteis decidiram apertar o gatilho de um tic-tac maldito
Outras (os) inúteis são jogadas (os) escada abaixo
Porque algum útil decidiu ser macho e esquecer de ser homem

O jejum é importante quando significa que estamos dispostos a deixar de
Nos empanturrar de nós mesmos
E preparar um banquete para receber de abraços apertados
Cheios de constrangimento terno
 Nossos queridos e ilustres inúteis

Que chegaram cansados, vindos das longínquas terras do “ao nosso lado”

21 de março de 2016

O amor proibido entre o vermelho e o azul em tempos de Impeachment

Arte de Konstantin Dimopoulos



Depois que o feitiço da ditadura foi instaurado, de um golpe só [e solitário],

Os seres humanos brasileiros foram convidados a se obrigarem a tingir seu sangue de azul

Abriu-se uma licitação para decidir qual remédio seria utilizado para vacinar a população

Concorriam pílulas de Viagra, pirulito Samblue e Injeções de Nazi-recalque

As rosas vermelhas, com medo de serem linchadas, decidiram florescer medrosamente azuis

Até mesmo a Ferrari sugeriu que a cor vermelha abandonasse a bandeira italiana tamanho o receio de ser considerada subversiva

Só não se sabia como ficariam as relações diplomáticas entre o Brasil, a França e os demais países que traziam o vermelho em suas bandeiras

Difícil foi convencer o sistema nervoso parassimpático a impedir as bochechas excitadas ou envergonhadas de ficar ruborizadas

O pastoril chorou ao ver seu cordão encarnado rumo a um exílio forçado em Berna

A vermelhidão do pôr-do-sol tentou se esconder na tintura dos vinhos ocultos na calada das adegas, mas as adagas da intolerância são dotadas de um GP-SS quase infalível, não fosse um poderoso vírus, cor de liberdade

Depois de três dias de instaurada a ditadura, o vírus atingiu suas duas primeiras vítimas. Elas sentiam dores enormes nas articulações quando tentavam puxar gatilhos ou acionar armas de efeito imoral

O DOI-CODI tentou ressurgir do fel, mas parou de doer, inutilizado pelo vírus

Outro sintoma da virose era uma atração incontrolável de pessoas vestidas de azul por pessoas 
vestidas de vermelho (e vice-versa). Era uma atração doce, sutil e libidanosa como o vermelhazul da aurora.

Quanto mais divergentes eram os pontos de vista destas pessoas, mais convergência havia entre seus olhares: meros disfarces de um futuro abraço capaz de reconciliar de uma vez por todas o fogo e a lua azul de Sinatra

Em sua fase aguda, as pessoas atingidas pelo vírus emitiam respeito e transpiravam franqueza e conseguiam apagar as fogueiras da inquisição com hálito cheirando a Halls azulvermelha

Quando se davam os corpos, os “inimigos” tornavam-se capazes de ressuscitar livros e obras censurados


Vermelho e azul enroscados tornavam-se uma nudez à prova de impeachments e capaz de inspirar a faixa de gaza a se transformar em faixa de pedestres com potencial para a usufruir do direito sagrado ao gozo supremo dos mortais.




14 de março de 2016

Impeachment, opinião pública e descodificação aberrante



Carl Rose - Mr. Biggott


No final dos anos 40, as pesquisas de Eunice Cooper e Marie Jahoda investigaram como os leitores recepcionavam a propaganda anti-preconceito na história Mr. Biggott, por meio da qual o artista Carl Rose utilizava o humor/ironia para desconstruir o antissemitismo.

Cooper e Jahoda detectaram uma nova modalidade do não-entendimento que não está relacionada ao intelecto, mas sim à resistência de quem lê a ter seus pressupostos abalados. O não-entendimento nesse caso funciona como mecanismo de preservação da auto-estima ou mesmo de defesa do orgulho ferido e é chamado de “descodificação aberrante”.

Nessa linha, a interpretação da mensagem é comparável a uma carga elétrica. Assim como as cargas geram em torno delas um campo elétrico, as mensagens também se inserem num campo, que pode ser de aceitação ou de recusa. E a inserção num desses campos pode se dar de maneira aberrante. Isto quer dizer que a audiência pode considerar a mensagem mais análoga a suas opiniões do que de fato a mensagem é ou vice-versa. As consequências são, respectivamente, a assimilação ou o contraste da mensagem.

A descodificação aberrante e seus efeitos de assimilação e contraste se aplicam ao debate em torno do atual cenário político brasileiro.

Diferentemente dos estudos da narrativa de Mr. Biggott, seria necessário estudar não a resistência a abandonar o preconceito, mas sim a facilitação da adesão ao preconceito. Exemplo disso é a proliferação de mensagens falaciosas cujos comentários nas redes sociais em vez de trabalharem em prol da reflexão, operam unicamente no sentido de reforçar campos de aceitação ou de recusa.

É o que ocorre quando a pessoa afirma que uma determinada figura pública não afirmou ser a favor da pedofilia e surgem comentários dizendo que ao afirmar tal coisa se está incentivando a pedofilia. Extrapola-se o raio de ação da opinião alheia vitimando-a com calúnias que, em meio ao caos abobalhado das redes, passam-se por meros “comments”. E tome curtir e emoticon pra cima pra disfarçar um discurso subjacente de incitação de ódio.

Em outra direção, tenta-se subjugar o poder de recusa. É o que ocorre, por exemplo, quando o indivíduo tenta argumentar que é contra o impeachment quando este remédio não respeita os parâmetros constitucionais e, pelo simples fato de levantar este argumento, é tachado de corrupto.
Algo semelhante ocorre com a participação nos protestos e a interpretação aberrante de que quem deles participa é um “brasileiro de verdade” e quem não participa é “cúmplice da bandalheira”.

Cooper e Jahoda identificaram que o não-entendimento pode ser máscara do desejo de permanecer aderido a preconceitos. No contexto atual, com auxílio refinado das redes sociais, observa-se uma espécie de ultra-entendimento. As mensagens são “entendidas” como mais claras do que realmente o são porque troca-se a reflexão e o entendimento pela ação de tomar a palavra do outro como deixa para dar vazão a nossos veredictos pré-datados. A mensagem alheia é transformada em alto-falante para repercutir o eco enfadonho das podreiras que jazem nos galpões de nossa futilidade reprimida.

O que Cooper e Jahoda achariam estranho, talvez, é que os preconceitos difundidos pela descodificação aberrante no momento atual não são privilégio dos mais velhos. Contrariamente, são preconceitos que se apresentam ainda mais arraigados no coração de jovens.

Desconfiar do nosso próprio entendimento é sempre saudável, embora doloroso e muito incômodo. Mas, é um exercício que estimula a liberação de paz e honradez na corrente sanguínea da sociedade.



13 de março de 2016

O zap e a flecha sem alvo

Fonte da Imagem: Significado de Tatuagens

Flecha
Por Linav Koriander


Vestígios de afeto naufragando num mar de invisibilidade que olhos exponencializados
Podem ver a anos-luz de distância
Capturado por redes sócio-solitárias
Esperando que você não tenha vontade de adiar o dia do seu nascimento
Pra que eu perca o paradeiro da festa.

Daqui a pouco me sentirei jovem, vestido de tempo perdido
Daqui a agora me sinto um velho com a pele de recém-nascido
Flor prematura que, antes dos frutos, liga o botão de ejetamento e faz voar pelos ares
Sementes de nunca mais
Pra deixar claro que não me ama, o olhar de quem me é caro optou por me enxergar
De dois em dois dias
Olhar sem direito a voz, equilibrando-se no estreito que separa os canyons do adeus ardente e do abraço frio

Espero que as atualizações da minha janela me tragam um Meu amor
Cuja escritura de posse seja, por Deus, apócrifa
Bárbara como o prazer que escolhe a hora exata de hesitar
E, untado em paradoxo, chegar ao clímax amparado pelo acaso e desatinado pelo destino

Rouba de minhas flechas o alvo
Porque teu beijo é a única coisa que precisa me atingir nesse momento

E o amor não se precisa atingir
Nem se beber (ins)tinto
Quem dirá extinto

Não consigo mais ser inteligente e inédito
E ter à disposição o tempo inteiro a palavra que teu coração precisa
Ou o trago de futilidade que tua mente carece pra descansar
Mas, posso ser o avião em pane que teu melhor salto de paraquedas
Emprestou a teu desejo de dormir tranquilo

Quando minha presença não for capaz de te excitar
Que meu carinho semi-distante te incite a pelo menos fingir
Que o mundo merece tua atenção e tua resposta
O mundo fora do burgo-zap

11 de março de 2016

Poerma* erótica para um sobrenome em caldas


Fonte: Fogão da Vovó


Em calda

Por Ivis Cilane

Cessa tudo que a antiga musa beija
Porque não só de H vive o omem
Peço uma xícara de "Te dana" a Raquel de Queiroz
Retoco minha cara lavada
E sego mesmo sem enxergar direito

Hoje nem precisei contratar um ouvinte de programa
Houve quem quis me ouvir de graça mesmo e se haver
Com minha terra à vista
Cheia de selvageria, mas sem cobrança de juros ou, sequer,de prometos
Mas, sou no máximo um ou dois gritos, meio tom acima da linha da doçura
Porra é o palavrão mas ão que sairá da minha boca porque nela só tem espaço para o Eu te amo

Se você quiser, mando você tomar, sem dizer onde
Porque prefiro beber contigo
Até que o zap nos separe

Quis te entrevistar pra poder ver teus lábios se mexendo
Excitando meu apaixonamento
Mas, talvez, você tenha achado, que eu estava atrás da merda do seu dinheiro

Pois deixa eu te dizer que nem se o dinheiro voltasse a se chamar Denario
E o Irã voltasse a se chamar Pérsia
Eu trocaria uma dose de teus beijos
Por um porre de dinheiro
Ora porra,
Não é só sexo, porque não estou viçando
Não é só viço porque não estou amando (ainda)

Não sou chegado em doce, mas se teu sobrenome for Caldas
Minha fantasia desta noite e uma mil
É você se derramar no meu horóscorpo.


*Poerma = poesia erma

8 de março de 2016

Por que as mulheres cometem menos infrações de trânsito?


Fonte da imagem: Freepik.com

Por Cláudio Eufrausino 
Analista de trânsito e jornalista


O velho adágio de que a mulher é um perigo quando está dirigindo veículos automotores não deve ser subestimado. Afinal, o “estar em trânsito” representa uma dimensão cada vez mais considerável da chamada vida útil.

Se considerarmos que o cometimento de infrações de trânsito reflete o afastamento de condutas relacionadas a um convívio social pacífico – ligado ao respeito do espaço público – as mulheres têm zelado mais pela civilidade que os homens. Do total de infrações cometidas em 2015 por homens e por mulheres, em Pernambuco (mais de 1,1 milhão), 75% foram cometidas por homens e 25% por mulheres.

Refletir sobre este quadro não é a promoção banal de uma guerra entre sexos.

O trânsito é, ao mesmo tempo metonímia e hipérbole do espaço público, caracterizado, no contexto atual, pelo que Walter Benjamin chama de “amores à última vista”, uma metáfora para descrever uma forma de interação social em que os encontros humanos oscilam rápida e drasticamente entre a intimidade e o anonimato, como se fôssemos capazes de, ao “esbarrar” com os outros, construir laços intensos de amor ou ódio, seguidos pela indiferença ou vice-versa. Os atores do trânsito, incluindo os pedestres, vivenciam continuamente este ciclo entre amor, ódio e indiferença.

É importante trazer à lembrança o ideário da civilidade, combinando os apelos da gentileza e da praticidade, como forma de fazer com que o referido ciclo não se achate, favorecendo deslizamentos entre os extremos do amor e do ódio ou o estacionamento no marco zero da indiferença.

Como se compreenderá num futuro próximo, a grosseria é um dos principais gargalos para que os processos sócio-econômicos tenham andamento (só pra efeito de exemplo, imagine o tempo-dinheiro perdido por conta de uma confusão no trânsito). É uma externalidade (algo que influencia o andamento do processo de forma não facilmente mensurável) que, historicamente, tem sido encarada como questão espiritual ou psíquica, mas que se localiza na fronteira entre ação e psique.

Se repararmos, gentileza ou grosseria são, talvez, as principais pontes de mediação entre os planos individual e coletivo. Quando se é rude acredita-se estar reivindicando o direito de não ter a individualidade anulada perante a do outro ou do grupo, ou se está tentando impor a individualidade perante o outro. No primeiro caso, observa-se a confusão entre criticidade e grosseria (algo bastante comum).

Voltando ao trânsito, a gentileza e o cuidado, nesse cenário, têm sido melhor administrados pelas mulheres, têm sido cultivados com o objetivo de germinar portas de acesso ao convívio social pacífico.

Porém, as mulheres devem estar vigilantes para não deixar a herança da gentileza no trânsito entrar numa rua sem saída. Isso porque se observa um aumento do percentual das infrações cometidas por mulheres. Em 2010, esse percentual era de 22% e, em 2016, já é de quase 26%. Felizmente, percebe-se uma diminuição da porcentagem de infrações cometidas por homens. Em 2010, esse percentual era de 77% e, em 2016, até o momento, está em 74% (trabalhamos com valores aproximados).

Dados:
  • ·    A infração mais cometida em 2015, tanto por homens quanto por mulheres, foi a de transitar com velocidade superior à máxima permitida pela via.
  • ·         No conjunto das mulheres, o número de infrações por excesso de velocidade ultrapassa a casa de 160 mil. 437.396 infrações deste tipo foram cometidas por homens, o que representa uma quantidade 2,7 maior que o das mulheres.
  • ·         O segundo lugar da lista das infrações mais cometidas– a de estacionamento irregular - é igualmente ocupado por homens e mulheres, sendo que a quantidade de infrações cometidas pelo sexo masculino é o dobro daquele cometido pelo sexo feminino.
  • ·         Com relação ao uso de celular ao volante, as infrações cometidas por mulheres ocupam a terceira posição no ranking. Já os homens, estão na sexta posição. Ainda assim, a quantidade deste tipo de infrações cometidas por homens é maior.

Fonte das estatísticas: Departamento Estadual de Trânsito - PE

5 de março de 2016

Um sonho na praia de Melhor Viagem


Fonte: Skycrapercity



Praia de Melhor Viagem
Por Linav Koriander

Meu sonho estava usando paletó e gravata
E trazia implícita em sua ternura uma foto
Ele segurando meus ombros, a maçã do meu rosto ameaçada por um beijo
Minhas pernas cercadas de jeans azul e meias brancas, inteiramente reféns de seus braços ternos
O seu traje a rigor combinava com meu traje sem rigor
Porque nossos corpos nus estavam apaixonados
E nossas almas se amavam

Não era necessário catar nos pensamentos dele motivos de eu não fazer parte dali

Eu podia me dar ao luxo de amá-lo menos que ele me amava
Porque nossas mãos dadas não eram roubadas, mas germinadas
E o seu querer me ver de novo não estava pré-datado para nunca
Visitava meu passado de amanhã, meu amanhã de presente
Sem precisar ser asfixiado por meu implorar

No colo do meu sonho, eu me permitia ser rotina e ele fuga doce e cristalina
Fugia para o meu lado todo sempre
Como quem fazia diariamente 1000 anos-luz de nado livre

Em silêncio, ele me ajudava a entender porque valia a pena amar a mim mesmo
E me disse pra não ter medo de acordar porque ele estaria me observando do “Em breve seremos refeitos um pro outro”

Desliguei o dia e, mesmo à sombra de um eclipse total, seu abraço forte não cansava de me olhar
Como esse abraço era capaz de me fazer sentir mais e mais bonito?
E, finalizados os abraços, eu continuava tranquilo
Porque o seu estar perto de mim era cheio de retorno

Saudade não era preciso porque quando
Ele me perguntava se eu queria me casar com ele antes de ontem
A enzima do abandono se inativava

“Sonho do meu sonho, carne da minha arte” foi o que a presença dele

Sussurrou no pé descalço do meu ouvido, que andava à beira da praia de Melhor Viagem

2 de março de 2016

Nazi-machismo e a fanpage Crítico Literário Hétero (sic)






Juro... Quer dizer, prometo, porque o juramento é assinatura falsificada de um cheque pré-datado para a verdade.

Prometo que estou tentando analisar a hipótese de que o curtir do Facebook não significa necessariamente uma adesão ao que se curte, mas, porventura, um manifesto irônico contra a estupidez ou uma celebração do riso de desespero perante piadas macabras.

Afim de pagar esta promessa, deixei-me conduzir por um link cultivado na minha timeline por um curtir alheio e entrei em contato com a fanpage“Crítico Literário Hétero” (repare a sutileza de quem acentuou um radical grego. Mas, quem sabe isso deva ser alguma excentricidade literária?).

Talvez, quem sabe, trate-se de uma obra de ficção, daquelas que escreve algo com o objetivo de conduzir o leitor a um texto implícito que busca dizer o contrário do texto explícito. Mas, praticar esta hipótese requereria uma boa-vontade hercúlea/polianesca. Os textos da referida fanpage são escritos em um Português que ignora tanto a norma padrão quanto as variações linguísticas, escondendo-se numa fachada de experimentalismo linguístico.

Na verdade (e na mentira), as palavras nessa Fanpage são mera excrecência de impulsos, grunhidos e muxoxos de uma (ou mais) mente (mentes) infantilóide(s) presas numa obsessão birrenta de erradicar a homossexualidade do planeta ou, melhor dizendo, de erradicar a possibilidade de alternativa que a diferença sexual representa.

Neste sentido, a fanpage imita toscamente a heterossexualidade e diz bem mal a que veio: lamentar o fim de um mundo que nunca existiu composto por seres humanos que são pênis da cabeça aos pés navegando num oceano de bebida alcoolica com vista para vaginas submissas treinadas para extrair esperma e morrer em seguida.

Repete-se a tentativa enfadonha de classificar as profissões como profissões dos heterossexuais e profissões dos homossexuais, assim como são enfadonhas as demais tentativas de classificar o que é feito pelo intelecto e pelo esforço físico com base no que se faz debaixo dos lençóis.

Não vou nem exigir coerência dos textos porque são textos claros, claramente tendenciosos e totalmente afastados do sentido da crítica que é colocar em crise os pressupostos e as verdades eleitas para o cargo de Miss Universo. A fanpage elege como antônimo da crise e do senso crítico o deboche insosso, insípido e inodoro, mas que não mata nenhuma sede, nem mesmo a sede de incitação ao ódio, a qual habita a fanpage.

Filme de terror que pretende fazer rir ou filme de comédia que aterroriza: escolham, à vontade, a melhor forma de descrever a fanpage "Crítico Literário Hétero". E preparem o coração para viver emoções pífias.

Manoel Castells aponta em seu livro A Sociedade em Rede, a crise pela qual passam os homens num contexto em que homens e mulheres cada vez mais estão em pé de equidade. Quanto maior a angústia diante desse fato, maior a necessidade de se apegar ao salva-vidas furado do machismo. A questão é que a ideologia macho não se fundamenta na masculinidade, mas sim na redução da mulher à condição de vagina capaz de tomar conta de uma casa, e na redução da homossexualidade a uma doença contagiosa.

O nazi-machismo sim é um vírus que se hospeda na masculinidade minando sua capacidade de transitar entre o yin e o yang e roubando a capacidade do homem se auto-afirmar. Os nazi-machistas só conseguem se afirmar por meio da negação: "Não sou viado"/"Não sou mulher" e quando dizem que gostam de mulhé (sic) apenas expressam um duvidoso senso artístico: atração por uma distorcida versão surrealista da mulher, reduzindo-a a uma vagina cabisbaixa, obediente e que o faça gozar não pelo contato entre os corpos e as almas, mas sim pela habilidade de dizer "Sim, meu amo e senhor".

A seguir, uma das “pérolas” gestadas por esta ostra viciada na tentativa de lançar no ostracismo o que não é espelho da decadente caricatura macho-man.

ALMOÇO NU - WILLIAM S. BURROUGHS
Peguei esse livro achando que rolava umas putaria com comida, tipo aquilo de sushi erótico, mas não. Na real, o livro tá cheio de nego usando heroína e altas cena de viadagem. Uma pouca de uma vergonha, livro de merda que ofende a moral e ensina os mini broder a entrar nas droga e no gayzismo. Porém, tu pode usar ele pra impressionar aquela gata top meio alterninha, que fuma uns baseado de vez em quando. Pessoalmente eu prefiro uma skol beats geladaça, mas até que rola fumar unzinho às vez pra dar um relax, kkkkk. O livro, se tu aguentar ler toda a viadagem que tem nele, serve até pra mostrar pra gata que tu não tem preconceito com esses boiola. Porque tem altas gata topzera que hoje em dia fica ofendida quando tu fala mal das amiga biba dela. Então é melhor de vez em quando calar o bico pra garantir a trepada TOP.

NOTA: 1 de 5 TOPS.
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