4 de setembro de 2012

O jubileu de ouro do Homem-Aranha e o cálice amargo da salvação

Capa da revista Amazing Spider-Man 700 (Marvel Comics) -
a revista será lançada
para comemorar os cinquenta anos do Aranha




O Homem-Aranha, criado por Stan Lee e Steve Ditko, talvez seja o primeiro super-herói que evidenciou o dilema da salvação. O Super-Homem, retrato de uma salvação ferida pela assepsia, salva de forma a tornar o mundo um cenário devastado pela paz e pelo silêncio.

Já para o Aranha, salvar não significa imprimir seus passos gloriosos na calçada da memória coletiva. Num caminho contrário, o gesto de salvar deste super-herói aproxima-se da angústia de saber que se terá de tomar, todas as noites, de um cálice amargo e no dia seguinte ainda ter de ir para a faculdade e, nas horas “vagas”, surfar no mar turbulento da vida de free-lancer como fotojornalista.

Assim como o leitor deve ter perdido o fôlego para acompanhar a oração precedente até o ponto final, Peter Parker precisa respirar fundo e vagar por Nova York em busca de preces por socorro, antes mesmo de elas serem feitas.

Internamente, uma compulsão de fundo cristão – potencializada pela voz de seu tio que, sem se rogar, usurpa o posto da voz da consciência do rapaz – convenceu o personagem de que não há como ajudar os outros a ter voz sem se oferecer em sacrifício como um carneiro emudecido

Externamente, Dostoievski e Murphy conspiram para que o esforço salvífico do super-herói não passe de uma reprodução do gesto “inútil” de Sísifo. Se bem que, como diria alguém que o disse, Sísifo é um incompreendido, pois o significado de seu gesto não é fazer a pedra chegar ao topo, mas sim lapidar sua alma nos altos e baixos da vida...

Peter Parker não tem apoio logístico e por isso fica impossibilitado de amar. E quando ama consegue deixar os mais próximos a ele fora do raio de ação de seu poder salvador. Assim foi com Gwen Stacy. Capturada por um de seus inimigos, o Duende Verde, a namorada do Aranha foi lançada do alto de uma ponte. Ao tentar salvá-la da queda, laçando-a com sua teia, o personagem acaba fazendo-a sucumbir aos efeitos da inércia, que quebra o pescoço da garota.

Há quem diga que a morte de Stacy tenha sido providenciada porque relacionamentos duradouros contribuem para envelhecer os super-heróis. Faz sentido, embora o carisma de Parker se deva ao fato de ele ser jovial nos problemas e angústias; velho, porém, na reponsabilidade e no sacrifício. É um personagem cujo coração faz pulsar em cada cinco minutos de entrega cinqüenta anos de amor ou de ridículo: felizmente, a diferença entre estes não pode ser captada por seu sentido (ou será no sense?) de aranha.

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