15 de fevereiro de 2012

O toque como esconderijo da espera como esconderijo da árvore do amor

Cena do filme A árvore do amor (2010)

Algum velho sábio (sempre há um velho sábio quando não temos coragem de dizer pessoalmente o que sentimos) dizia que no gesto de tocar quem se ama moram dois relógios: um atrasado e um adiantado.

Um toque pode revelar precipitação e angústia, o desejo de invadir o outro com hora marcada para descartá-lo. Por outro lado, o toque pode marcar um compasso de espera, como ponteiros de um relógio que, por mais distantes que estejam, aceitam a demora como pré-requisito do pleno encontro que, caso tudo dê certo, ocorrerá à meia-noite ou ao meio-dia.

O toque como morada de um relógio atrasado ou reservatório do encanto da disposição de esperar pelo outro. Este é o cenário mais marcante, dentre as belas paisagens do filme A árvore do amor, dirigido por Zhang Yimou.

Claro que o desejo de adiantar o relógio nunca é silenciado completamente. E isso faz com que o sentido do tato migre para os demais sentidos, tentando transformá-los em sucursais do toque. E assim ocorre com o olhar. Em português, o verbo olhar perde a sutileza. Ver, mirar, encarar, observar, despir. Tudo meio que se confunde no significado “olhar”.

Mas, quando a espera que mora no toque migra para o olhar e este se torna tato, entra em cena o verbo “to gaze”: contemplar. E se existe uma forma de tocar o que ainda não é possível alcançar, esta forma é olhar (esperar) (contemplar).

A árvore do amor fala sobre os processos migratórios do toque e como ele tenta acertar os dois relógios que nele habitam. Jing e Sun, os apaixonados do filme, tentam lidar com o desejo de se tocarem, com os interditos que a cultura chinesa (em pleno auge da revolução comunista de Mao Tsé-Tung) impõe ao toque (em sentido amplo e estrito), e também com o investimento na espera, como forma de conferir valor ao toque.  

Em uma das cenas, eles desejam tocar a mão um do outro e, para enfrentar o interdito, fazem o seu toque migrar para um galho que, segurado por ambos, os une. Cada olhar dos personagens, o primeiro beijo no rosto, o primeiro abraço. Toda aproximação entre eles é como se os ponteiros do relógio rezassem para chegar o momento de se encontrarem meia-noite ou meio-dia. E, neste momento, os amantes poderiam contemplar o impossível: ver cumprir-se o mito da árvore de flores brancas que, ao ter o solo onde está plantada regado pelo sangue dos combatentes da revolução comunista, teria se tornado capaz de produzir flores vermelhas.

"Eu vou te esperar até que você complete 29 anos e, se não for possível, então esperarei a vida inteira". Esta declaração de amor do personagem Sun expõe o que o gesto de tocar tenta esconder: a ruidosa fronteira entre possível e impossível

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