31 de dezembro de 2012

A Esperança que calçou o sorriso do Ano Novo





A Esperança que calçou o sorriso do Ano Novo

Um poema de Cerevenise Stür


Esperança minha, que tenta se equilibrar
Um dos pés calçado num mundo imenso, enfeitado de vida inteira pela frente
O outro calça o menor dos mundos, azeitado pelo tempo que não retorna
E, mesmo desengonçada, calçada por mundos tão díspares
A esperança me surpreende com sua elegância e desenvoltura
Ela adquiriu este traquejo ao ver a Virgem Mãe esmagar a cabeça da serpente,
Cujo veneno era o abandono da capacidade de crer que o veio do coração humano
Sempre tem uma pedra rara cravada no grotão de seu mistério: pedra furta-cor,
Que oscila entre tons de maravilhamento e tons de dor
A esperança assistiu ao caminhar de um Menino no calvário
Ele trazia uma pomba branca equilibrada no seu doce olhar
Todo horror e cruz se curvavam diante daquela pomba e daquele mar
Porque aos pés do Homem que carregava a cruz
Estava uma Criança a espera de um abraço
As mãos daquele Pequeno Rei eram o refúgio onde a balança
Encontrava a calibragem da Justiça,
Os arco-íris o candor da Aliança
E as mãos dadas a mesura da Paz
O mundo pequeno dos enormes desesperos tenta plantar queda nos pés da Esperança
Mas, o sorriso do Ano Novo que respira a inocência do Menino
Descobre uma tempestade de ressurreição radiante
No último suspiro do Homem
E desta inesperada nascente
A esperança encontrou forças para se reequilibrar
E terminar o desfile mais elegante do que os nuncas ,os sempres e os talvezes
Foi quando a queda se deu conta de que havia trocado a nudez da solidão e do medo
Por uma veste ornada com 365 motivos para ficar de pé
Foi aí que a Esperança entendeu
Que a queda era uma pista de decolagem para seu voo
E, assim, partiu do nosso coração, que era de Jesus, que era do Homem, que era do Menino
Coração que era mapa de um tesouro que podemos inventar com as cores frescas da Lua,
Imersa em uma luz que lhe é própria porque se doou por completo
Oração que era a chama de um  honesto Pulsar
Era e há de ser...

29 de dezembro de 2012

Que bom que Françoise Hardy não desistiu de amar loucamente


Capa do mais recente disco de Françoise Hardy

Em 1988, a cantora francesa, Françoise Hardy, havia anunciado o final de sua carreira. Mas, como todo bom romântico, ela tratou de convencer o apocalipse a mudar de ideia e deixar o fim para outro lendemain qualquer. Desde então gravou pelo menos quatro vezes, tendo seu disco mais recente, L’amour fou, sido lançado mês passado.

As músicas de Hardy resistem à tentação pós-moderna de colonizar o único terreno que ainda resta livre das naus da racionalização: o terreno da incerteza e da surpresa ou, em outras palavras, o terreno do coração.

De alguma forma, são canções que nos desafiam a nos reacostumarmos com a dose de mistério e loucura necessária à manutenção da própria racionalidade. Não seria isto a poesia: um convite ao sincretismo entre a loucura e a racionalidade que nos habitam? Não seria o esforço de divorciar estes dois entes que os tornariam ilhas inóspitas e altamente perigosas? 

Parecemos estar plenamente adaptados à inconstância e à efemeridade, mas agimos como se todas as relações pudessem ser um esquema onde fossem conhecidos todos os liames entre passado, presente e futuro. O ciclo das mudanças gira cada vez mais rápido, mas somos imaturos em lidar com o risco que é inerente aos relacionamentos. Em vez de fazer do risco um momento de prazer suscitado pelo esforço conjunto de elaborar novas etapas das relações, preferimos fazer do sintoma motivo para enterrar o doente antes mesmo que ele morra.

Somos analfabetos no que se refere ao enfrentamento de riscos.  Por nos acharmos capazes de aparar todas as arestas da incerteza, a frustração mínima se torna motivo de deflagração do Apocalipse. Achamo-nos pés no chão, uma geração que, ao contrário das anteriores, não é mais escrava da transcendência, tendo descoberto enfim como usufruir a realidade, a concretude. Mas, o que há de mais impalpável e transcendental do que o fetiche do “fim”, do que buscar num beijo não a boca que se beija, mas todas as outras que porventura poderiam, talvez, ser beijadas?

Existe um abismo entre o que buscamos e o que achamos no outro. Novidade nenhuma... O que é novo, na mesmice que fere a poesia de Françoise Hardy é a pergunta: “Como lidar com o desafio constante de amarmos numa pessoa aquilo que não sabemos ao certo se é a pessoa?”

alvez o neorromantismo de Françoise Hardy procure um campo para enfrentar este questionamento, que não sejam as miragens igualmente transcendentais do eterno e do efêmero.

Pour quoi vou?
Françoise Hardy
J’ignore si ce que j'aime en vous
C'est vous
Mes idées deviennent floues
Je suis à bout
Pourquoi vous ?
Et ce vertige qui me prend tout à coup
Il me viendrait d’où ?
De moi ou
De vous ?
Je me sens vraiment en dessous de tout
Je ne tiens plus bien debout
Sans doute
Un coup
De grisou
Inutile de me mettre en joue
J'avoue
Comme un arrière-goût
D'amour fou
Tabou
N'essayez pas de m'arracher
La moindre bribe du moindre regret
Lever le voile pourrait gâcher
Tout ce qui nous lie de loin pour de près
Je ne viendrai jamais à bout
De flou
Qui brouille mes vœux sur vous
Mais si j’échoue
On s'en fout
Se peut-il qu'il y a l'un de nous
Qui joue
À tendre l'autre joue
Si c'est vous
J'absous
Vous resterez au grand jamais
Le plus brûlant de tous mes secrets
Nous resterons au grand jamais
Loin l'un de l'autre et pourtant tellement près

24 de dezembro de 2012

Quando Jesus nasceu para se tornar o terceiro batimento do coração humano


Manuel da Costa Ataíde - A Virgem Entrega o Menino Jesus a Santo Antônio

O menino Jesus e os três batimentos cardíacos

Um poema de Jose Luis Paredis

O Menino Jesus não mentiu
Ele já tinha a idade do tempo sem tempo
Quando viu os pentes das metralhadoras sorrindo e zombando da paz
Em seguida assistiu a um efeito do Photoshop clarear os dentes de uma pessoa
Em agonia
Dentes claros de um ser humano grávido da fome
(Os filhos da fome não são jamais órfãos
O pai da criança – a indiferença – deu-lhes seu sobrenome,
E o pequenino Cristo, com sua perfeita acuidade visual,
Penou para identificar aquele nome borrado por debaixo das águas trêmulas,
Sacudidas pelas centenas de mãos de Pôncios Pilatos que tentavam se limpar
Com o choro contido daquelas mulheres que eram obrigadas a escolher entre chorar ou
Continuar vivas

Mas, o Menino Jesus não mentiu
Olhou para o cálice amargo e para a cruz
Sua intuição de mágico lhe dizia
Que aqueles rios de dores não conseguiriam extinguir
O mar da ressurreição
Para o qual o leito das esperanças, com o mais sutil vigor (ou vigorosa sutileza),
Abre caminho

O Menino Jesus não mentiu
Ele não era mais capaz de desistir do ser humano
Após vê-lo vestido em rios de dores
Rios rudes e ásperos
Cachoeiras de desertos a escorrer
Dos pesados montes que traziam sobre os ombros
Mas, o coração humano, que batia uma vez para a indiferença
E outra para a misericórdia
Escorria, por uma ferida aberta, um rio secreto de cura
E de uma alegria que, mesmo durando um só segundo,
Fez, faz e fará todos os tempos descobrirem que nunca estiveram sozinhos
E que valeria a pena nascer
Desde que fosse para combater o bom combate ao som
Da batida daquela uma vez que o coração humano batia
Para fazer corar de vergonha a batida intrusa da indiferença

O Menino Jesus não mentiu quando disse
Que trocaria a vida
Para fazer o peito humano bater
Em compasso Ternário
E, assim, nasceu e se fez a Terceira e Decisiva batida
do coração
O Menino Deus não mentiu quando nasceu para descobrir, no silêncio, que
Esse terceiro batimento cardíaco se chamava amor.

* Meu Feliz Natal a Alguém Nobre

20 de dezembro de 2012

As estranhas vontades de nossos amigos para antes do fim do mundo

Calendário Maia 

Chego quase à conclusão (visto que um libriano conclusivo é um libriano doente!) de que o fim do mundo é um tipo de gênio da lâmpada a esperar ansiosamente que confessemos vontades estranhas. E, como é sabido por quem bem o sabe, a estranheza tem um lado encantador e surpreendente. Digo isso ao lembrar vontades de amigos meus, inspiradas pelos últimos suspiros do calendário maia. A seguir, listo algumas:

Anderson Lima – vontade de encontrar a receita da piada perfeita e convencer a todos que o riso é mais forte que a vergonha

Anuska Vaz - vontade de reler Os Maias, de Eça de Queiroz, e de, por meio de sua impressionante fotogenia (de Anuska e não de Eça :P), fazer o fim do mundo sair com cara de recomeço na foto de primeira página da Esperança.

Amós Andrade - vontade de fazer da simpatia uma dízima periódica, terminada em 99999999999...

Aline Figueiroa - arquitetar uma vingança de raios lunares em cada jardim de Burle Marx, onde não mais fizesse sentido proibir nenhum fruto.

Igor Bandim – vontade de plantar um livro e escrever uma árvore e, antes e depois, compartilhar estas vitórias com os amigos que, mesmo longe, sempre são próximos. Vontade de ler nossas dores secretas até inventar um título que seja capaz de curá-las.

Leonardo Sodré - transformar o azul do céu ou dos mares num tatame (um tato que ame) onde o Aikido possa praticar as pessoas

Boris da Aliança- criar um manual ensinando os franceses a serem o melhor dos brasileiros e os brasileiros o melhor dos franceses.

Marcelo Diniz - ensinar todo aquele que está prestes a cair a se reerguer como um aikidoca e a vencer como um cavalheiro.

Felipe Simões - unir as esferas do dragão para fazer uma festa comemorando sua alforria

Sabryna do Aikidô- fazer de cada nota musical um espetáculo, dos sustenidos mágica e dos bemóis milagres e de toda essa sinfonia plateia que aplaude o coração humano.

Paulo Gurgel - transformar a pobreza num sonho que acorda desabrochado em flor de esperança, solidariedade e paz

Paulo Ricardo Almeida - apagar os incêndios de Ribeirão Preto e do Mundo e convidar a fé e a doçura para andarem na garupa do Grand Canyon ao longo de uma motocicleta.

Renata Scarpin - multiplicar pela clave de sol a luz do Espírito Santo e refleti-la mundo a fora no sorriso da fé.

Mário Daher - ser milionário o suficiente para poder fazer doações a todos os continentes até que a desigualdade se renda ao charme do Aikidô.

Dyego Holanda - escalar o Everest para dar um abraço caloroso no coelho da Duracell e juntos fazerem uma oração pela paz mundial.

Ana Geny - dividir o último gole de alegria infinita com a sedenta justiça.

Carla Araújo - vontade de dar um abração bem apertado no Visconde Partido ao Meio.

Delzuita dos Prazeres Lima - vontade de participar de um passeio ciclístico em Nibiru e ganhar como medalha a paz mundial.

Everson Cavalcanti - vontade de, com categoria, sair correndo, ao mesmo tempo, nu e de sunga branca pelas ruas recifenses. Isso pra servir de exemplo aos que anseiam despir-se dos invisíveis grilhões.

Fábio Soares Nunes - vontade de fazer o cerimonial do Encontro de Paz entre o Oriente, o Ocidente e Recife (o maior continente da América Latina).

Fátima Ferreira - vontade de convidar a elegância para dançar a última primeira dança ao som da primeira última música

Helga Vieira - vontade de criar o projeto arquitetônico de um lugar onde os traumas sofridos pelos animais possam ser apagados.

Karla Gisele Vidal: vontade de substituir os exércitos e as guerras por esquadrões da moda e missões de paz.

Gustavo Táriba - vontade de sabotar a fábrica da coca-cola e adquirir franquias da grife Star Wars para propagar o lado áureo da Força.

Juliana Mafra – vontade de desenvolver um software que desprograme o rancor, a mágoa e o preconceito

Ivana Perobelli - vontade de buscar no 1% de tempo que resta o amor indivisível.

Elizabeth Moura - vontade de ensinar os espíritos tristes a dançar balé para que o cisne branco que neles há ressuscite.

Ozan Revi - abrir uma empresa de exportação, sem fins lucrativos, cujo principal produto é o azul ardente do céu de Recife, que, de alguma forma, mora também nos seus olhos turco-britânicos.

Ana Paula Costa - vontade de que todos tenham a chance de voltar pra casa e encontrem um Eu-te-amo de pé à soleira da porta, despindo-se das luas de saudade

July Holanda – vontade de tocar violino até curar os gritos e silenciar as dores.

Mauro Torres – vontade de pedir emprestado ao Pequeno Príncipe um dos cometas que ele guarda na garagem do sonho

Aislam Melo – vontade de promover um acordo de cooperação entre Nárnia e a vida real

Mariana Silveira– vontade de ajudar a luz a pesar mais que a injustiça na balança dos destinos.

Sarah Catão- vontade de patentear seu sorriso como remédio para toda e qualquer esterilidade

Lylian Cabral – vontade de não deixar ninguém que ama sem saber que é amado.

Iara Lima – abrir uma filial da amizade sincera na Zona Franca e instaurar um tipo de comunismo em que todos tenham direito a plena liberdade de expressão e a um iate particular.

Mahely Barros – vontade de tornar a vida a cara da riqueza, com direito a limpeza de pele para extrair as marcas da arrogância e da auto-suficiência.

Wanessa Loyo – vontade de que o sorriso deixe de ser medida provisória e se torne decreto-liberdade.

Alberes – vontade de pintar com silêncios quadros impressionistas, fazendo do ser amigo uma rima com a luminosidade.

Augusto Noronha – vontade encontrar carinho e respeito onde supostamente só havia desajuste e, durante o processo, adquirir a versão pós-fim-do-mundo de Ghost Recon.

Marluce Vidal – vontade de nos aproximar da canção do Céu.

Noaldo Vidal – vontade de nos tornar felizes vítimas da conspiração da fantasia.

Luciana Zamprogne – vontade de ajudar os outros a fazerem da contradição um ato de fé e um gesto de lealdade.

Tony Pradines - vontade de cancelar a reserva no restaurante Leite e ir comer com os amigos um petit gateau de nata-goiaba no La comédie da Via Láctea

Ana Carolina Morais – vontade de plantar uma espada samurai e colher uma cachoeira de carinho.

Magaly Rocha - vontade de ensinar as armas de fogo a jogar fora o uniforme de guerra e se vestirem como as flores da Holanda.

Iliana Quidute - vontade de cantar com uma multidão uma música esculpida no milagre.

Renata Vieira - vontade de sentar aos pés do sonho e escutá-lo contar uma história para ninar o tempo e de,  acordar com vontade de prescrever para todos os impacientes os efeitos colaterais do amor: respeito, idealismo e paz

Renata Marques – vontade de fazer a esperança fluir através dos poros do rosto, hidratando os sorrisos, e dos poros da alma, dignificando as cicatrizes.

Amigos do Aikidô – vontade de treinar até o equilíbrio energético do planeta ser restaurado.

Cláudio Clécio – vontade de suspender o fim do mundo até seu Eu-te-amo chegar ao coração do Nobre Alguém.


Fim do mundo narrado por Galvão Bueno

17 de dezembro de 2012

A bondade e os beija-flores

Fonte: site Virtude- Birdwatching e Natureza


Beija-flores
Poesia de Milia Cdíades 

Tua alma é boa e linda
É tímida vez por sempre
Nada que um abraço, um carinho ou
Outro desses silenciosos despudores
Não possam acolher em sua ternura galopante

Nos poucos segundos de premonição que me restam,
Quero dizer que teu futuro é de uma riqueza
Que fará os títulos e os poderes trocarem os tronos e os dinheiros
Por um lugar às margens da lealdade e da singeleza
E tu haverás de crescer, mas não será mais preciso
Que teu crescimento esteja ancorado a troféu ou amargura

Tu serás grande entre os seres humanos
Porque, desde sempre, és humano entre os grandes
E os des-sorrisos, os medos e os silêncios
Não te tornam Alguém menos bom
Nem as conquistas te tornam mais Nobre
Porque o idioma das glórias é mudez nos lábios da bondade
E o pastor invisível que habita teus gestos
Me contou que muitos ainda serão felizes
E, de fato, já o são
Por experimentarem a luz esmeralda
Da tua bondade ranzinza e séria e blasé e íntegra

Pena que minha presença é insuportável a tua bondade
Como é insuportável às asas do beija-flor virar escultura
Mas os que tiverem o privilégio de te ter por perto
Entenderão, cedo e tarde, que a bondade não é o clichê do sorriso preso nos lábios:
É  a alegria implícita num perseverante bater de asas


11 de dezembro de 2012

A encantadora dos números: filha de Lord Byron cria o primeiro programa de computador

Por Minouette

Augusta Ada Byron não se valeu do renomado sobrenome de seu pai, o escritor ultrarromântico Lord Byron, como senha para entrar para a história. É mais conhecida como a condessa Ada Lovelace. Mas, nesse caso, o sobrenome Lovelace deve a ela sua fama e não o contrário, visto ter sido a jovem a primeira pessoa a criar um programa de computador. Atualmente, ela empresta seu nome a uma linguagem de progrmação: a ADA, desenvolvida pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos e utilizada na aviação.

Lovelace não manteve laços estreitos com o pai, que morreu quando ela tinha 8 anos . Só veio conhecer o rosto de Byron, por meio de um retrato, ao fazer 20 anos. Não herdou dele as feridas do "mal do século", mas, certamente talvez, algo do ímpeto byroniano estava em sua personalidade que, desafiando o conservadorismo da era vitoriana, desenvolveu pesquisas junto a Charles Babbage, criador do primeiro computador mecânico.

Ada Lovelace - Por Sydney Padua

A mãe de Ada chegou a suspeitar de que sua filha pudesse ser louca. Mas, a moça conseguiu lidar bem isso, convertendo um possível complexo de inferioridade em cultivo da criatividade. Assim, logo cedo, dedicou-se a desenvolver modelos matemáticos para descrever o funcionamento do sistema nervoso.

Chamada por Babbage de "encantadora dos números", Lovelace também despertou a admiração de outros cientistas como Faraday, um dos fundadores da eletroquímica e do eletromagnetismo. Sem sucesso, ele tentou programar um relacionamento amoroso com ela.

Contudo, Ada deu um passo além de Babbage, refletindo sobre a possibilidade da programação em computadores não ficar restrita ao domínio do número, abrangendo, por exemplo, a música.

Lord Byron foi protagonista de inúmeros escândalos, sendo conhecida, por exemplo, sua tendência à necrofilia. Ada não chegou nem perto desta excentricidade, mas manteve relações extraconjugais e esteve envolvida com o jogo. Chegou a se endividar ao investir na construção de modelos matemáticos que garantissem o sucesso na jogatina.

Anualmente, em outubro, é celebrado o Ada Lovelace Day, com o objetivo de promover o trabalho de mulheres no núcleo duro das ciências, a exemplo da matemática e da engenharia. Ada teve três filhos e faleceu em 1852, aos 36 anos.

Sobre Ada, dirá Babbage:

Forget this world and all its troubles and if
possible its multitudinous Charlatans – every thing
in short but the Enchantress of Numbers.


Por Sydney Padua

A contradança de Zhaoming Wu

Dancer - Zhaoming Wu



Contradança
Uma poesia de Cerevenise Stür

Hoje, ouvi dizerem teu nome
Tentei ser o mais racional impossível
Tão racional que meu olhar chorou para dentro
E o fogo do meu coração fingiu ser cinzas
Desde antes do alarme de incêndio

Quero tanto que seja verdade que tu possas ler este poema
Quem me dera, pudesses me dar um sinal,
Visitando o poema que nunca termina,
Feito para ti, meu lindo Alguém.

Pois te vi faz uma semana, mas tive medo de te olhar
E te deixar preocupado ou triste
Mas, se eu pudesse te olhar
Seria para te dar o máximo da errante medida certa
Do carinho, do abraço, do beijo e da felicidade
E descobrir que não sou invisível a ti
Como a razão insiste em fazer crer

Por isso, estas palavras
Cegas, mudas e aleijadas
Mas que têm uma qualidade que intimida
As águias, as sereias e Mercúrio
A de enxergar através da sombra
Falar por meio do não dito, do interdito
E me permitir chegar ao teu coração, meu Nobre 
Antes mesmo de o caminho começar a ser feito
E me impedir de ir embora, apontando-me para o caminho que nunca termina

Porque o caminho sempre estará por fazer 
Para que eu tenha a honra de te convidar para voarmos juntos
Nesta contradança que, em seus passos desajeitados,
Dá sentido aos giros dos mundos: e se chama vida.

8 de dezembro de 2012

Para ternamente constranger Nossa Senhora da Conceição


Fonte: site Artesanata.com


Nossa Senhora, sempre que escrevo é como se fizesse das palavras
Um mapa do fim do mundo
Do xis que indica onde, a céus abertos,
A Terra desesconde a concórdia

A poesia é um jeito de deixar os outros
Ternamente constrangidos
Ou de fazer o Eu te amo e seus afluentes
Desaguarem para mares que, de tanto não existirem,
Merecem ser inventados

Quero te dizer, Nossa Senhora,
Da vontade de acrescentar ao rol dos teus Nomes
O nome dos que me são queridos
E estes nomes serão apelidos carinhosos
Que te dedico
Pois só teu Coração
Permite que esqueçamos de te amar
Para que, nas bases desta deslembrança,
Ergamos uma forma de amar o Nobre Alguém

Tu sobreviveste às sete espadas de dor
Que as profecias lançaram em teu peito
Por não teres medo de que o amor seja verdade.
Por isso, Cristo te deu o dom
De seres porta de entrada para o milagre
De seres a fonte de onde o vinho novo brota,
Desafiando o odre vazio das angústias e desesperos
Por isso, mundos inteiros
Te conhecem e conhecerão pelos Nomes
E pelos apelidos
E não será estranho que o próprio silêncio
Fale em honra a Ti


A seguir, a poesia-canção para Maria:

Nossa Senhora do Afã

Maria, tu és o mais forte dos afãs
Contigo, eu posso a Utopia abraçar

Tu és o penhor do enigma
A brisa em seu despertar
A pressa que escolta a calma e a paz

Amparo em meio ao absurdo
A voz do silêncio a escutar
O sonho que torna o real de existir capaz

Maria, em ti há refúgio pro’amanhã
E os tiros se cansam de um alvo procurar

Se falas, a guerra emudece
Teu canto faz o sol singrar
Teu choro ajoelha as estrelas e o mar
As ondas que quebram em espinhos
Teus passos irão consertar
E das quase-mortes renasço
Para amar


Nossa Senhora do Afã (audio)

30 de novembro de 2012

Em nome do ócio e da amizade: o que há de comum entre o Face e as cartas em verso do século XVI?

As Três Graças - de Antonio Canova

 

Em nome do ócio e da amizade, mais recente livro de Saulo Neiva, reúne as pontas soltas de uma trama que, no século das Grandes Navegações, aproximava as palavras amizade, ócio e poesia.

A obra coloca em evidência a turbulenta fronteira entre o território do “Adeus” e o território do “Estou de volta”, fazendo inquietações do século XXI, acerca da permanência ou do fim de valores como sinceridade e eternidade, tornarem-se objeto de debate quando refletidas pelas Cartas em Verso, gênero (espelho torto) literário do século XVI, aparentemente lançado no esquecimento pelo advento do Romantismo.

Neste sentido, a proposta metodológica do autor dialoga com o universo de Jung, para quem o futuro, tantas vezes, é o movimento de passados que buscam a superfície do mar da história para tomar fôlego, aproveitando a oportunidade para mostrar à atmosfera como respirar novos ares.

A Carta em Versos almejou dar forma literária ao desejo de fazer da palavra uma entidade ao mesmo tempo pública e privada. Algo semelhante ao que ocorre nas redes sociais, onde uma mensagem, mesmo direcionada a alguéns específicos, é passível de ser compartilhada por pessoas não pertencentes à reserva “ecológica” da intimidade. O professor Lourival Holanda, durante o evento de lançamento de Em Nome do Ócio, destacou que a escrita de Francisco de Sá Miranda, irmão do governador-geral Mem de Sá e grande representante deste gênero, em muitos pontos é comparável às postagens do Facebook, cujo eixo central é a amizade e o ócio. “O que é diferente da ociosidade. O ócio é a contrapartida do negócio. É um momento em que a preocupação deixa de ser fazer o mundo girar e passa a ser contemplar o mundo”, explica.

A esfera do negócio gira em torno do pragmatismo e do interesse. Conforme a moral da época, inspirada pela herança greco-latina, não havia aí espaço para a amizade verdadeira, plantada entre aqueles que se escolhem mutuamente para que, juntos, possam compartilhar do ócio, o espaço em que o espírito humano se desamarraria das convenções e se permitiria recriar a realidade, buscando inspiração na companhia daquele (s) com que se escolhe estar “amigado”.

As imagens alegóricas eram, nesse caso, utilizadas como veículos a transitar entre um significado “universal” – crido como capaz de atravessar os tempos – e um particular alicerçado nas preocupações que linkavam remetente e destinatário.


Talvez este gênero tenha logo esmaecido por não dar conta de uma angústia que lhe era subjacente e que reinvidica, por meio das redes sociais, o direito de navegar nos contemporâneos mares do “agora ou nunca”. Esta angústia diz (des)respeito a coisas que, à primeira vista, parecem banais, mas requerem uma visita profunda a nossos temores e coragens. É uma angústia que pode ser traduzida em questões como:

Como devo agir se tenho a meu dispor milhões de amigos em potencial, mas, não tenho ferramentas para transformar esta amizade em ato?

Como fazer para administrar dentro de mim as vontades contraditórias de ser eternamente amigo e de colocar novos eternos amigos no lugar do primeiro?

Como ser ou ter um amigo sincero sob a pressão de uma cultura ameaçada pelo monopólio exclusivo colonial do interesse (entendido na vibe de Maquiavel, isto é, como pacto entre meio e finalidade sem direito ao contraditório)?

Como lidar com o desejo de ser um amigo “eterno” quando a eternidade é vista como disfarce da obsessão e o carinho como uma espécie de prelúdio de uma sinfonia de agiotagem?

Como ser digno de ser escolhido como amigo por Alguém?

Uma coisa é (in)certa. O livro, como chama atenção Lourival Holanda, nos faz pensar sobre nosso relacionamento com as virtudes cívicas: igualdade, liberdade e fraternidade. “Podemos abrir mão da igualdade, quando reconhecemos que alguém, por determinados fatores, como a experiência ou a área de atuação, é hierarquicamente superior. Podemos abrir mão da liberdade quando, por vontade, ficamos meio que presos e submissos a quem amamos. Mas, não há como abrir mão da fraternidade, pois sem ela não há possibilidade de convívio nem com nós mesmos, nem com os outros”, conclui.


Mostra-me, amigo, onde está o eterno
Pois, já não me lembro
Mas, ele respira de dentro/fora do mais profundo de mim
Enquanto caminha na corda bamba

Mostra-me, amigo, onde está o não-estar do fugaz
Que me mantém capturado na sombra do seu quase rastro
E na luz do seu eterno despertar

Mostra-me como ter escolha e, ao mesmo tempo,
Ser capaz de ter a tua companhia

Mostra-me como posso me mostrar e continuar
Contemplando o nascer e o se pôr do mistério

E, então, te mostro como, sendo cego,
Posso ser teu guia enquanto me emprestas teus passos.


A Anuska e Gustavo e Saulo e Mahely e Pradines e...




28 de novembro de 2012

Jose Luis Paredis e a escrita vaga das ondas




Puente Libertador (Venezuela) - Kevin Vásquez

Puente Libertador
Um poema de Jose Luis Paredis


Teu mar quando me lê, o dentro de mim começa a se reescrever
Suas vagas conclusões me têm nas mãos e contramãos
E seu olhar, que brota da arrebentação
Do derrame da palavra,
Esse fruto que pede passagem para vir ao mundo antes da flor

Mar que desmente os poros rochosos do pensamento
Que faz dos lemes acanhados calcanhares
Flechados pela esperança do reencontro

No peito desse mar, bate a tua decisão

E quando a decisão é firme
Não há acaso que não se converta em destino

Um raio de luz
Foi plantado
Nas águas

Do meu
Texto,
Descosturado
Em todas
As pétalas
De sua
Rosa
De ventos

Eras tu a ler-me nos poemas de amor que escrevi para teu anjo da guarda, com quem
Converso
Para te fazer companhia
Quando decides visitar as palavras minhas: leitos de um naufrágio que sufraga
O tesouro da escolha do Alguém, do Nobre, que me inebria com sua lucidez
Que cada vez conheço mais
Porque tenho
A Alegria De
descobrir o quanto não te conheço

E confirmar, nas linhas da mão da tempestade
Que
Em ti
Confio

25 de novembro de 2012

Platão entra em curto-circuito no Amanhecer da saga Crepúsculo




Cena de Breakingdawn, part Two

Acusada por muitos de ser uma versão insossa e maneirista de Anne Rice, Stephenie Meyer montou sua própria mitologia vampírica a partir de destroços de outras narrativas. Os vampiros da saga Crepúsculo, em alguns momentos, parecem mutantes dos X-Men: não os mutantes clássicos, a exemplo de Wolverine, mas os da recente e decadente safra, bem representada pela Shark Girl, nova mutante de origem brasileira, mais precisamente da praia de Boa Viagem, em Recife.

Porém, algo que encanta nas histórias de Meyer é a sua coragem de pensar como seria viver a eternidade sob a pressão das demandas do humano demasiado humano.  O maior desafio de Edward, durante a saga, foi fugir da intensidade do amor de Bella, que vinha desafiar a calmaria da eternidade com a qual ele estava acostumado. Ele era capaz de permanecer sem comer ou dormir, pois era imortal. Mas, depois de se apaixonar, teve a alma invadida por todos os apetites dos mortais. Contudo, o rapaz estava perdido, pois depois de experimentar tal fome, seria impraticável ter de volta o deserto da saciedade que sua alma desapaixonada nutria.

Por ~KathiexSxWorld
Já Bella foi capturada pelo paradoxo. Ao tocar Edward, sentia o afago que a distância tem a oferecer. Ao receber seu carinho, flertava com o risco de ser morta, caso o rapaz não conseguisse controlar seus impulsos vampíricos. A pele de Edward não podia oferecer a ela o calor vital, mas ele estava lá, como os silêncios sem os quais o ápice das sinfonias seria impossível. Bella se apaixonou porque, em Edward, encontrou uma fórmula jamais pensada pelos românticos. Viveu o amor platônico em todos os angustiantes detalhes da experiência sensorial (na verdade, ultrassensorial).

E, no mar de equívocos em que navega a saga Crepúsculo, os detalhes oferecem reconfortantes surpresas. É o que acontece com relação ao personagem Jacob, homem-lobo que, até o episódio Amanhecer, duelava com Edward pelo amor de Bella. Jacob também experimenta um amor platônico. Mas, como revela o final da saga, o personagem ama, em Bella, a presença de alguém que ainda viria a existir. É uma impressionante metáfora. Jacob faz jus à ideia do amor eterno, tão eterno que se dá nos dois sentidos da trajetória do tempo. Sua amada é por ele amada antes mesmo de nascer.

Na verdade, em Amanhecer, ocorre um tipo de curto-circuito do amor platônico. Quanto maior parece ser a distância entre os amados, mais palpável parece ser a proximidade entre eles, como se toda a energia dos cinco sentidos migrasse para um tipo de toque extrassensorial  que faz da ausência uma mão a mais na hora do abraço, um olhar a mais na hora da contemplação, um minuto a mais na hora da eternidade.

22 de novembro de 2012

Ação de Graças por um Nobre Alguém

Kevin Vásquez - Aurinegro em Caracas

A graça da gratidão

Por Enriomar Cojenos

Lapidei a raridade
E, vi que o caminho que lá se escondia,
Conduzia ao teu coração
Que, mesmo nos lampejos de brutalidade,
Faz a pedra mais preciosa corar de vergonha
Quando tu voltas a falar comigo,
Percebo porque a gratidão merece não ter preço
No dia de ação de graças,
O mar deságua nas minhas vertigens
E suas ondas já não sabem como agir
O melhor que elas têm conseguido é sentir saudade
E agradecer a Deus por ter aberto mão do dinheiro
Para me dar de presente tua presença
E me honrar com este brilho que ensina a prata a brilhar
Com esta sombra que renova as luas e os anoiteceres
Com este tempo que me dá a alegria de nascer
Para ser grato à distância
Cada vez que ela desiste de me separar de ti


18 de novembro de 2012

Quando Lady Macbeth se torna gueixa e Macbeth Pinóquio

Os atores Cláudio Fontana e Marcelo Antony na peça Macbeht, de Shakespeare



Fazer uma crítica é, em errada medida, apresentar nossas expectativas a nossas frustrações. Outra forma de definir a crítica seria como o trajeto entre uma observação prévia – venenosa e imprevidente – e uma futura observação revista e prudente. Mas, certamente talvez, a crítica, e no caso da crítica teatral essa característica se torna marcante, tem como função romper as amarras de perfeição e da completude, que ameaçam estrangular a obra. A crítica devolve ao espetáculo a capacidade de voltar a ser ensaio.

Passeei por todas as definições de crítica, mencionadas acima, ao assistir à leitura que Gabriel Vilela deu a Macbeth, texto de Shakespeare, cujo personagem-título foi interpretado por Marcelo Antony no palco do Teatro Santa Isabel, em Recife.

Ao chegar ao teatro, crítico inexperiente que sou, acionei uma pequena dose de veneno adoçada por uma quota de irresponsabilidade. Disse então, antes de o espetáculo ter a chance de dar o primeiro suspiro:

- Que cenário interessante, apesar dos garrafões de água mineral localizados ao fundo.

Observação idiota. A mesma coisa de dizer que As Meninas, de Velázquez, é um quadro fantástico, apesar de o pintor ter deixado, no quadro, a porta aberta...

Em seguida, a peça começou e, conversando com os botões que fechavam o traje do silêncio, fiz outra observação menos idiota:

- Marcelo Antony está um pouco estranho. Ele foi uma das melhores interpretações de Pilatos na história do espetáculo da Paixão de Cristo em Nova Jerusalém. Mas, como Macbeh parece meio “canastrão”.

O dia seguinte viria me provar, assim como provou a Lady Macbeth, que minha teoria estava errada. Mas, em vez de me jogar da sacada do primeiro andar, escrevo esta crítica para lavar as idiotas precipitações que escorrem das mãos de um crítico cultural.

Na saída do teatro, fui apresentado por minha amiga Anuska, a um grande estudioso de Shakespeare: João César de Castro Rocha. Ele nos perguntou se havíamos observado como, no decorrer da peça, as expressões corporais de Macbeth iam se tornando mecânicas, como se sua autonomia desse lugar à gestualidade de um boneco. Bem observado: o Macbeth de Marcelo Antony, por força da pressão interna de sua ambição e da pressão externa por se adequar às expectativas alheias, torna-se um títere (não à toa deve ter sido a escolha de Shicó do Mamulengo para fazer os figurinos e adereços da peça).

Cogitei a hipótese de que o falar do ator remetia ao trejeitos artificais do falar dos mamulengos que se apresentam para as crianças no Nordeste. Isso, quem sabe, misturado à afetação e aos maneirismos que davam contorno aos gestos das cortes em fins da Idade Média.

Então percebi quão digno era o esforço de Antony, um grande ator, para emprestar artificialidade à voz e aos gestos, reservando a carga dramática para os detalhes. A artificialidade, nesse caso, dava mostras do desespero de alguém que não pode ser ele mesmo  de tão ético que é. Sim, Macbeth é tão ético que tenta a loucura de satisfazer, ao mesmo tempo, as demandas da sociedade, dos deuses (ou demônios), de seu coração e de sua esposa (uma mistura das demandas listadas anteriormente).


Macbeth é lido pelo diretor Gabriel Vilela como uma espécie de Pinóquio que decide deixar de ser menino para se tornar boneco. E Lady Macbeth é a rainha das fadas virada ao avesso e conspirando para que o personagem deixe o nariz crescer até se tornar afiado o suficiente para assinar com sangue a proposta que viria a ser feita por Maquiavel de, em nome da vitória no jogo político, trancar fora de cena o escrúpulo e o moralismo.

Numa alusão ao já mencionado quadro de Velázques, Macbeth torna-se refém da própria imagem e acaba preso na sua própria pintura, donde, como uma  pervertida mistura de Dom Quixote e Dorian Grey, enfrenta seus inimigos. Antes, havia vencido exércitos, mas, acaba sendo derrotado pelo maior exército do mundo, constituído de um só soldado: a culpa.

A leitura que a montagem deu às bruxas que prenunciam o destino de Macbeth traz à peça um humor que causa desconfortante alívio: muito bom!

Porém, como de costume, a personagem mais cativante é Lady Macbeth. A alma dela torna cativo o Macbeth que mora em cada um de nós. E as correntes deste cativeiro ganham um brilho reluzente com auxílio da interpretação de Cláudio Fontana. Só uma atuação marcante como esta para  fazer esquecer o trauma de ter visto Lady Macbeth ganhar vida na pele de Vera Fisher...

A Lady Macbeth da montagem de Gabriel Villela traz nos passos uma gueixa, nas atitudes a revolta de Lilith e nas mãos o sangue que Caim fez derramar, sangue que não para de clamar dos confins do mundo. É uma dama bretã com feições do teatro Kabuki . Fontana encontrou no homem a pulsão ardente da mulher e na mulher a pulsão ardente do ser humano.

A esta altura, espero já ter deixado para trás as observações venenoso-irresponsáveis, dignas daquele tipo de crítico que analisa uma obra como um quiromante que lê a palma do próprio furico.

Sim, não me esqueci dos garrafões de água mineral. Eles têm função cênica. Quem viver para assistir ao espetáculo verá!

13 de novembro de 2012

Aprendendo a superar uma desilusão amorosa com Camile Claudel (ou Scarlet O'hara)



Camile Claudel - a tribute -  By Marco Donner

Rodin era talentoso e também o era Camile Claudel
Que pena ela ter enxergado a vida como um deserto e ter feito do cafajeste do Rodin a última coca-cola .
Camile era expert em esculpir miragens e não teve coragem ou não teve medo o suficiente
Para, em vez de se tornar esquizofrênica, ter dito a Rodin:
- Pô, velho, você é um idiota. Eu ainda te amo, mas, não faz mal, o amor vai ficar cicatrizado e logo chegará o século XX e eu poderei cantar a música de Ivan Lins que fala sobre corações que de tão cicatrizados nem parecem que foram colados.
Rodin não teve culpa. Nem Camile.
Que pena que Camile levou a sério alguém que a chamou de desequilibrada
Que pena que Camile decidiu desconfiar do mundo inteiro
Tá certo que o mundo não merece lá muita confiança
Mas, quem desconfia de tudo perde a chance de achar a alegria da surpresa
Dou, nesse instante, as mãos a Scarlet O’hara  e digo:
- Nem que eu tenha de matar, trair, roubar, enganar e torcer pelo Náutico... Jamais me apaixonarei por alguém que questiona minha sanidade novamente .
Putz, esqueci-me de que jurar é um pecado mortal
Mas, não faz mal: Ontem é sempre um novo dia que costumamos disfarçar de amanhã
E já rezei tantas vezes o Ofício da Imaculada, que devo ter 300 mil milhas de indulgência
E não corro o risco de ficar desamparado pois, graças a Deus, minha conexão com o Céu
Não  é feita por nenhuma operadora de celular fiscalizada pela Anatel
Rodin, só por hoje, só para que eu possa redimir um pouco a tristeza de Camile Claudel,
Quero te dizer: Vá para o diabo que o carregue, seu covarde,
Camile Claudel foi idiota, mas era uma idiota linda
Pena que não deu continuidade à sua maior escultura:  “Rodin indo para o raio que o parta”
Camile Claudel esculpiu em parceria com Rodin A porta do Inferno
E ele não teve a decência de convidá-la para sair...
Mas, não foi culpa dele, nem dela
Pois, quem pode moldar a escultura de tempestade que Cupido fez
Quando a fábrica do amor suspendeu a produção de flechas?
Camile, você era linda, mas, infelizmente, a psiquiatria da época era precária
E você não teve chance de conhecer a Chapada Diamantina
Quem dera eu pudesse pedir a Pigmaleão para corrigir as falhas da escultura dO Pensador
Para que ele pudesse te ver e te oferecer um jantar à luz de galáxias
E depois vocês fossem para a cama e colocassem um belo par de chifres em Rodin
Meu Deus, como seria delicieux!
Sim, Rodin era um gênio
Mas, a história certamente cometeu uma injustiça,
Pois o verdadeiro autor da escultura Os amantes foi Camile Claudel.

O juramento de Scarlet O'hara

9 de novembro de 2012

"Esse cara sou eu": Deixem em paz a pieguice de Roberto Carlos!



Roberto Carlos

De início, ri muito quando li, no Facebook, uma análise psicológica que foi feita do perfil do “cara” da nova música de Roberto Carlos: “Esse cara sou eu”. Mas, o riso fácil é um tipo de diagnóstico que comumente requer uma segunda opinião.

A análise psicológica, reproduzida ao fim da postagem, afirma que por trás do perfil romântico que Roberto Carlos desenha na canção mora uma espécie de maníaco obsessivo de quem se deve fugir.

Pelos mil nomes de Nossa Senhora! Tudo bem não gostar da música, achar que ela é piegas. Mas, reflitamos sobre a corrente mania das pessoas de querer encontrar em qualquer ato, palavra ou omissão um indício de que o Esquadrão da Moda deve se colocar a postos com camisas-de-força.

Machado de Assis escreveu o conto O Alienista em 1882, mas nunca ele esteve tão atual. O conto fala sobre como o impulso de procurar a loucura nos mínimos gestos dos outros pode levar o próprio dono deste impulso à loucura.

Mas, vamos à poesia de Roberto Carlos. Como poesia, ela é o que os teóricos da literatura e das artes chamam de ato de fingir. Fingir que envolve a dissimulação, mas também a doçura, a alegria. È um fingir em que o artista se esforça para reescrever a realidade e não para reproduzi-la. E mesmo que ele queira iludir-se de que é capaz de reproduzir a realidade com base na evidência, não será capaz de reproduzir a unicidade dos momentos, que pertence também ao terreno do invisível.

É o fingimento poético que permite experimentarmos a dor, a mentira, o ódio sem que estes sentimentos precisem se tornar fatos.

É o que acontece na poesia de Roberto Carlos. Ele pode não estar amando ninguém, mas, no texto poético, ele ama um alguém que é feito por todos os outros alguéns que ele amou ou por nenhum deles em particular.

Tudo bem querermos ser reservados, introspectivos e fazer do “I wanna be alone” um estilo de vida. Mas, é um pouco irritante a ideia de pensar que não podemos olhar para alguém ou elogiar ou tocar o ombro da pessoa sem que sejamos confundidos com um Drácula de Bram Stoker que quer tomar posse da alma e do sangue alheios.

Aviso aos navegantes da racionalidade tacanha e aos ignorantes que tomam overdoses de senso comum a bordo da nave do sentido literal : Esse cara sou eu é composta de hipérboles. Não me vão fazer, como já ouvi num programa de rádio, de comentar sobre a suposta insensatez de Roberto Carlos ao escrever “Eu quero ter um milhão de amigos”. Pelo lado áureo da Força: Ter um milhão de amigos é uma metáfora!

Ninguém “conta os segundos” quando alguém demora
Alguém que chama o outro no meio da noite pra dizer que o ama, fará isso só numa ocasião especial em que quer ser poético. Não se trata de um transtorno obsessivo compulsivo (TOC).

E, saibam os arautos da racionalidade, que toda pessoa tem algum grau de TOC. Paremos com o mau-costume de sair por aí acusando os outros de psicose. É feio, galera!  Além de tudo, o povo não sabe o que é psicose e fica por aí dizendo que alguém é psicótico porque contratou o carrinho de som da telemensagem. Essa pessoa é no máximo inconveniente, porque um psicopata, como é sabido por quem bem o sabe, não esboça emoções.

Deixemos Roberto Carlos e o cara que ele é em paz  #pelamordedeus. E, façamos um curso de reciclagem poética, para deixarmos de ocultar sob o véu da racionalidade a paranóia contemporânea de nos colocarmos na vibe de chapeuzinhos vermelhos e acharmos que o carinho e a poesia – por mais escassos que estejam no mercado – são armadilhas de lobos-maus e obsessores.


5 de novembro de 2012

Primeiro texto dos silêncios

Fonte da imagem: Flickr


Primeiro esboço de alguns silêncios
Por Alzira Reis


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24 de outubro de 2012

A oração que Carminha e Nina podiam ter feito para salvar Avenida Brasil



Cena de Avenida Brasil


O melhor remédio para a insônia é assistir a algo que faça o sentimento surpreender o seu proprietário (o coração). O pior, porém eficaz, é assistir a algo que não convença, como os últimos capítulos de Avenida Brasil.

Heloísa Perissé se esforçou, mas sua atuação não conseguiu convencer que a personagem Monalisa continuava amando Tufão. Afinal, ela havia passado a novela inteira convencendo o público de que seu amor não era mais Tufão, mas sim o personagem Silas.

Monalisa reconquistou o amor de sua vida com um carro de som que oferecia um serviço de telemensagens. Nessa hora, cheguei mesmo a acreditar que os dois se amavam, pois só um amor a altura do livro bíblico Cântico dos Cânticos para resistir à provação de ser torturado pelo carro de som da telemensagem. Se bem que minha mãe ficou emocionada quando eu contratei esse serviço para homenageá-la em seu aniversário.

Mas, o autor da novela poderia ter misericórdia e, ao menos, compor uma poesia para ser veiculada pelo carro de som. Algo mais ou menos assim:

“Quis acreditar que havia deixado de te amar porque tinha medo de fazer o caminho de volta antes que meus calcanhares de Aquiles cicatrizassem das flechadas que partiam do arco do engano”. Tipo: é meloso, mas ameniza o pânico propagado pelos alto-falantes do carro de som.

Tufão também não colaborou para que o clima de romance fosse convincente. Melhor dizendo, quem não colaborou foi a atuação de Murilo Benício que transformou Tufão numa descompromissada brisa: saudades eternas de sua performance no filme Amores Possíveis...

Coerente a revelação de que Carminha matou Max. Coerente como a composição química de um sonífero. Mesmo a visceral interpretação de Adriana Esteves não convenceu ao tentar passar a mensagem de que Carmem Lúcia se arrependera. Marcelo Novaes também não colaborou, pois sua interpretação de Max daria motivos não para que o personagem fosse assassinado, mas sim para que fosse exonerado.

O pedido de perdão de Carminha talvez tivesse convencido mais se ela houvesse feito uma oração. Algo do tipo:

“Queria não me chamar Carmen Lúcia por alguns instantes e esquecer como se pede desculpas e olhar para trás e não ver crimes, mas apenas equívocos; não equívocos, mas somente mal-entendidos; não mentiras, mas só um desejo de ter podido ajudar tua solidão a ser menos só e te pedir que tua companhia ajudasse minha companhia a ser menos egoísta, exigente e, quem dirá, afixiante...” .

Simplesmente deixaram para lá a hipótese de que Nina sofresse, mesmo que de leve, de um transtorno bipolar. Não convenceu!

Talvez o capítulo tivesse sido mais interessante se tivéssemos tido a chance de ouvir uma oração de Carminha e outra de Nina. Algo como:

“Quero que um anjo te visite e diga que o bem que tento fazer por ti secretamente não precisa te causar medo ou espanto. Fiz o bem (esta foi minha maior ambição depois de acreditar na esperança). Agora, me despeço sem esperar que a novela acabe”.


16 de outubro de 2012

Poética da aterrissagem

Foto by Jordon Cooper


Aterrissar
Um poema de Quiaimandré

Toda vez que tu retornas meu peito levanta voo
E toda minha doença fica no terminal de passageiros
A cura não vem sem dor e, para desespero da saudade, não está de passagem
Veio para ficar, como uma cigana que monta prisão perpétua no chão incógnito da liberdade
Quando, mesmo sem ir te buscar,
Chego na hora exata de te encontrar
Embora a falta que sinto do abraço que não me deste
Chegue adiantada
Enquanto o abraço que sonho te emprestar
Sempre se atrasa e deixa de cumprir seu descompromisso
Não vou te dar um abraço
Vou te emprestar um
Para ter o pretexto de que me devolvas este abraço com juros
E prometo que o juro do abraço é a graça de um beijo
Cada vez que te reencontro
Agradeço por teres aterrissado em segurança,
Um Alguém tão lindo: que faz a mais linda paisagem
Pecar por falta, virando esboço
E salvar-se por excesso, na medida certa da utopia


15 de outubro de 2012

O mais instigante doodle de quase todos os tempos depois do doodle do Pacman


Winsor McCay foi o primeiro a desenvolver uma técnica para animação de desenhos, tendo inspirado artistas como Walt Disney e Walter Lantz (criador do Pica-Pau). Mitologia, no sense, estética surrealista e um algo de noir marcam sua obra. McCay também gostava de promover contrastes entre a inocência e a monstruosidade, criando seres fofinhos, mas capazes de causar, despretensiosamente, grandes catástrofes. Mais tarde, estas criaturas do imaginário do cartunista viriam a inspirar a feitura cinematográfica de personagens como King Kong e Godizilla. Contemporaneamente, reflexos destes seres podem ser encontrados em personagens dos mangás e dos animês.

McCay também fez a animação The sinking of the Lusitania, com motivação ideológica, a fim de estimular a entrada dos Estados Unidos na I Guerra Mundial e incitar o sentimento de anti-germanismo.

O trabalho de McCay provavelmente encontrou inspiração na obra do cineasta Georges Méliès.
Robert Winsor McCay Jr., filho de MacCay, também se tornou um cartunista de destaque e especializou-se em colorização, trabalhando para editoras como a Detective Comics (DC). 

O google criou, no dia 15 de outubro de 2012, um dos mais instigantes doodles que já existiu até o feriadão de 12 de outubro, em homenagem a MacCay. Ele pode ser visto no vídeo a seguir (melhor, só o doodle do trigésimo aniversário do Pacman!):


The sinking of the Lusitania

Gertie the Dinosaur (Winsor McCay, 1914)


Viagem à Lua - Georges Méliès
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